Governo começa a estudar mudanças no FGTS
BRASÍLIA
- O governo pretende mudar o modelo do FGTS, que passaria a ser responsável
pelo seguro-desemprego e por assegurar aos trabalhadores do setor privado uma
aposentadoria complementar no regime de capitalização. A reforma do Fundo teria
por objetivo criar uma poupança de longo prazo no país e melhorar as contas
públicas. Para a equipe econômica, a remuneração paga aos cotistas (3% ao ano,
mais a Taxa Referencial, TR) é baixa, o que estimula o saque do dinheiro. A
permissão para a retirada do saldo em casos de demissão sem justa causa também
incentiva a rotatividade excessiva no mercado de trabalho.
O
Ministério da Fazenda avalia que a aplicação dos recursos a juros abaixo dos
cobrados no mercado de crédito gera distorções, ao beneficiar um segmento com
condições mais facilitadas (habitação, por exemplo), forçando aumento da taxa
de juros para o restante da economia.
Por
outro lado, os gastos com seguro-desemprego, pago a quem é demitido sem justa
causa, pressionam as contas públicas, tanto em períodos de crescimento
econômico (quando há maior facilidade de troca de emprego), como na recessão
(quando as empresas demitem, porque os funcionários têm pouco tempo de casa e
pouco vínculo com a firma). O auxílio não tem qualquer custo para o
trabalhador.
FAZENDA
VÊ INCENTIVO À ROTATIVIDADE
Para
a Fazenda, a rede de proteção aos trabalhadores depende da poupança de longo
prazo. O caminho é alterar a Lei 8.036/90, que criou o FGTS e as formas de
saque e remuneração. Para isso, a Secretaria do Tesouro Nacional abriu, em 25
de agosto, um processo de licitação para selecionar estudo sobre “Diagnóstico e
propostas de reforma para o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço”, com
recursos do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud). O prazo
para a inscrição terminou ontem, e os trabalhos finais devem ser entregues
dentro de 60 dias, a contar da assinatura do contrato.
Segundo
documento sobre o Termo de Referência dessa licitação, ao qual O GLOBO teve
acesso, o funcionamento de uma rede de proteção ao trabalhador e a viabilidade
do sistema previdenciário dependem de mecanismos de construção de poupança de
longo prazo no Brasil. “A configuração atual do FGTS requer reavaliação”,
instrui o texto.
O
documento ressalta que o modelo atual não estimula o empregador a investir no
funcionário e prejudica a produtividade nacional: “A possibilidade de saque dos
recursos do Fundo nas demissões sem justa causa estimula a rotatividade
excessiva no mercado de trabalho, reduzindo as possibilidades de treinamento de
trabalhadores e redundando em baixa produtividade”, diz o texto.
As
regras vigentes sobre o seguro-desemprego pago aos demitidos sem justa causa,
segundo o texto, “induzem menor esforço do trabalhador para se recolocar no
mercado de trabalho e, inclusive, fraudes”. O documento conclui que, diante
disso, tornam-se relevante reformas que aprimorem o regime atual de proteção
social ao trabalhador.
“Aventa-se,
nesse sentido, a possibilidade de criação de um benefício financiado por um regime
de capitalização, de contribuição compulsória para o FGTS — que passaria a ter
um caráter híbrido, funcionando simultaneamente como seguro-desemprego e
poupança capitalizada para a aposentadoria”.
O
texto destaca que o dinheiro do FGTS, enquanto não é sacado, é usado pelo
governo para fazer programas, como financiamento habitacional e de obras de
infraestrutura e saneamento básico. No documento, a Fazenda não diz como
ficariam os empréstimos para a casa própria em caso de mudança.
REMUNERAÇÃO
BAIXA PARA O TRABALHADOR
No
governo do PT, os recursos do Fundo passaram a ser usados para fazer política
habitacional como no programa Minha Casa Minha Vida, principalmente na
concessão de subsídios (descontos a fundo perdido). Desde 2009, quando o
programa foi criado, foram gastos R$ 39,066 bilhões com subsídios. Entre 2015 e
2016, foram transferidos para o Fundo de Arrendamento Residencial (FAR), que
deveria ter sido abastecido só com dinheiro público, mais R$ 8 bilhões. Foi a
opção encontrada pela gestão petista para continuar doando casas na faixa 1
(para quem tem renda de até R$ 1.800).
Para
Rodolfo Torelly, do site especializado Trabalho Hoje, o projeto do governo
reúne três em um, ao juntar seguro-desemprego, FGTS e aposentadoria em um
sistema único. Segundo ele, a medida precisa ser adotada com cautela, para
evitar prejuízos aos trabalhadores. Torelly destacou que o FGTS virou um fundo
para fazer política pública às custas de uma remuneração baixa para os
trabalhadores:
—
O trabalhador recebe uma subremuneração — disse.
Para
o representante da Força Sindical no Conselho Deliberativo do Fundo de Amparo
ao Trabalhador (FAT), Sérgio Leite, a proposta é descabida. O FAT hoje é a
fonte de recursos para o seguro-desemprego. Leite defende que, se não tem
dinheiro para arcar com o seguro-desemprego, o FAT deve pedir de volta recursos
repassados ao BNDES, em vez de usar o FGTS para esta finalidade. O Fundo,
mencionou, é um direito do trabalhador.
Procurada,
a assessoria da Fazenda não quis comentar o assunto. Segundo técnicos, porém,
não há decisão tomada e, por isso, serão feitos estudos para ver se a proposta
é viável. A questão ainda está em fase embrionária, disseram.
O
Globo
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