Partidos ignoram denúncias na Lava-Jato e não investigam filiados.
SÃO PAULO — Apesar da avalanche
de acusações levantadas pela Lava-Jato contra políticos, os órgãos internos dos
partidos destinados a fiscalizar a postura ética de seus filiados têm tido
atuação quase nula. Nos três anos da operação, 98 integrantes do PP, PT, PMDB e
PSDB — as quatro siglas com mais implicados — foram citados em delações, mas as
legendas fecharam os olhos para praticamente todas as denúncias relatadas.
Não é por falta de normas
que as punições não ocorrem. Os estatutos e códigos de ética dos partidos
condenam atos de improbidades e que ferem a ética cometidos nos exercícios de
mandatos e cargos públicos, como os apontados pelos delatores. São previstos
processos disciplinares que podem resultar até na expulsão do filiado.
— As acusações não envolvem
só um desvio individual, mas estão relacionadas com o financiamento do conjunto
do partido. A cúpulas partidárias estão no jogo e quando estão envolvidas é
muito difícil a punição — avalia o cientista político Fernando Abrucio,
professor da FGV.
Nos quatro partidos com mais
citados, todos os presidentes são investigados. A petista Gleisi Hoffmann teve
a denúncia aceita e responde ação por corrupção e lavagem de dinheiro. O tucano
Aécio Neves, licenciado da presidência do PSDB, foi denunciado pela
Procuradoria Geral da República (PGR), que pediu sua prisão. O presidente do
PMDB, Romero Jucá, flagrado em áudio defendendo estancar a Lava-Jato, é alvo de
cinco inquéritos. Ciro Nogueira, presidente do PP, também foi denunciado pela
PGR.
Em 2014, no início da
Lava-Jato, o PT decidiu abrir procedimento na comissão de ética do partido
contra o deputado André Vargas (PR), acusado de usar o avião do doleiro Alberto
Youssef. Na época, as investigações sugeriam que se tratava de um caso isolado.
Vargas, até hoje preso em Curitiba, pediu sua desfiliação antes da conclusão da
apuração.
‘AMPLO DIREITO DE DEFESA’
Nos meses seguintes, quando
a Lava-Jato avançou sobre a cúpula do partido — com a prisão, inclusive, do
tesoureiro da legenda, João Vaccarri Neto —, os procedimentos disciplinares foram
deixados de lado. O estatuto do PT prevê até suspensão preventiva por 60 dias
diante de notícias que vinculem filiados à corrupção. Apesar de 25 citados, a
medida foi aplicada só contra o então líder do governo no Senado, Delcídio
Amaral (MS), preso em novembro de 2015. No dia da punição, já surgiam
especulações de delação de Delcídio. Em março de 2016, o senador se desfiliou.
Vargas e Delcídio foram os
únicos dos 98 políticos investigados em seus partidos. As outras três legendas
com mais filiados citados na Lava-Jato não abriram procedimento, apesar de
pressões internas. No PSDB, há um movimento na base para punir Aécio.
— Está na hora de a gente
dizer que se nosso presidente nacional fez o que está colocado aí, ele deve ser
levado ao conselho de ética e expulso — defendeu o deputado estadual Carlos
Bezerra, no encontro do PSDB de São Paulo semana passada.
Mas para o presidente do
conselho de ética e disciplina do partido, deputado Bonifácio Andrada (MG), o
órgão não tem função de investigar esses casos e deve se limitar basicamente a
cuidar da disciplina dos filiados.
— Se o partido se meter a
querer investigar os filiados pelas atividades externas, vira Poder Judiciário
e polícia. A comissão de ética deve ser limitada às normas da ética e disciplina
da vida partidária.
No PMDB, um grupo de
deputados chegou a pedir afastamento dos dirigentes alvos.
— Se eu falar, vou ser
antiético — disse o presidente da comissão de ética do partido, Eduardo Krause,
que indicou o presidente da legenda, Romero Jucá, para comentar o assunto. Jucá
não respondeu.
O presidente do conselho de
ética do PP, deputado André Fufuca, também não respondeu.
*Colaborou Silvia Amorim
Jornal O Globo
Nenhum comentário