Diretor do Portal 247 em Brasília diz que prefeito Olivânio deu demonstração de força.
Na caravana, Lula reencontra
o povo
Num país onde a queixa sobre
a apatia da grande massa dos cidadãos tornou-se o grande lugar comum das
análises políticas, a caravana de Luiz Inácio Lula da Silva pelo Nordeste
oferece uma surpresa e tanto.
Num fenômeno pouco visível
para quem limita-se a acompanhar a realidade do país pela cobertura dos grandes
monopólios da mídia familiar, basta reconstruir o que aconteceu neste domingo,
quando a caravana completava seu 10 o dia, para se ter uma noção adequada do
que se passa no fundão da política brasileira.
Depois de fazer, no sábado,
um discurso de 43 minutos para uma pequena multidão reunida no Ponto Cem Réis,
na região central da capital paraibana, Lula assumiu seu lugar no ônibus número
1 da caravana, líder de um comboio com outros dois ônibus e pelo menos nove
automóveis e veículos mais leves.
O plano do dia era percorrer
os 277 quilômetros que separam João Pessoa para chegar a Currais Novos, no Rio
Grande do Norte. Num esforço para recuperar velhas audiências e estabelecer
novos laços com um eleitorado que esmagou o Partido dos Trabalhadores em 2016,
a ideia era convocar aliados, militantes e eleitores mais irredutíveis para dar
um novo oxigênio a máquina de um partido.
A proposta se resumia a organizar
três comícios num único dia, o que por si só já seria uma proeza respeitável.
Mas, ao longo do dia se descobriu que ao menos uma parcela da população local
achou que isso era pouco para quem pretendia ouvir Lula. Sem condição de comparecer aos locais
pré-estabelecidos, em diversos pontos do trajeto os moradores da beira do
caminho resolveram participar da festa de forma imprevista.
Na medida em que a caravana
se aproximava, em vários pontos do trajeto eles se concentravam à beira da
estrada para saudar Lula e acompanhantes. Quando a concentração -- de homens,
mulheres, jovens e muitas crianças – atingia um bom tamanho, a caravana era
obrigada a parar. Se o volume de gente era mesmo grande, Lula descia e fazia
uma pequena saudação – era isso, exatamente, o que pretendiam as pessoas que
corriam pela beira da estrada.
Em Acari, já no Rio Grande
do Norte, ocorreu a grande cena do dia. Estimulada pelo prefeito local, que é
filiado ao PMDB, uma pequena massa começou a se concentrar nas vizinhanças do
asfalto. Quando a caravana se aproximou,
até uma parcela dos fiéis que acompanhavam a missa de domingo, numa igreja das
redondezas aderiu a mobilização. A estrada acabou bloqueada, aos gritos de
“Lula, Lula, Lula”. Com um novo comício pela frente, o próprio não discursou
porque precisava poupar a voz. Mas desceu do ônibus para conversas rápidas com
quem estava por perto.
De forma mais organizada, os
comícios definiram uma ajudam a entender uma situação clara. Assistindo, a partir da posse de Michel
Temer-Henrique Meirelles, ao desmanche de direitos definidos durante a passagem
do Partido dos Trabalhadores pelo Planalto, uma parcela considerável de
brasileiros encara um possível retorno de Lula à Presidência como a principal
esperança para preservar suas conquistas – e estão dispostos a lutar por isso.
Com uma pequena produção de
queijo em Caicó, que distribui em duas cidades do Rio Grande do Norte, Mário
Luiz da Silva fez questão de comparecer a última parada do dia, o comício de
Currais Novos. “Precisamos garantir a vitória do Lula no primeiro turno”, diz
ele. “Não falo por mim, pois nunca obtive qualquer benefício direto pelas
medidas do governo. Mas pelos programas sociais, que beneficiam a população
mais pobre e, dessa forma, fazem bem para o país inteiro. ” Num dos lados do
palco, o comício de Currais Novos exibia um boneco de Lula. Nada a ver com o
execrável pixuleco nos tempos de Lava Jato, mas um Lula bem trabalhado e
esculpido, com rosto bem desenhado e camisa vermelha-PT brilhante.
Ao longo de sua carreira, o
deputado-sindicalista Vicentinho esteve em Currais Novos em duas situações. Em
2002, quando Lula venceu as eleições presidenciais pela primeira vez, e na
semana passada. “ A mudança é total, disse ele ao 247. Em 2002, as pessoas
respondiam ao discurso do candidato do PT “virando o polegar para baixo, em
sinal negativo”. Ontem, era só aplauso.
“Aqui é uma região conservadora, mas a compreensão do papel de Lula está clara.
”
Prefeito de Picuí, única das
223 cidades da Paraíba na qual o Partido dos Trabalhadores ganhou as eleições
para a prefeitura em 2016, Olivânio Remígio fez, no domingo, uma respeitável
demonstração de força. Numa cidade com 19000 habitantes, colocou perto de 5000
pessoas na praça principal para saudar Lula -- na matemática, de cada quatro
moradores de Picuí, pelo menos um saiu de casa para dar seu apoio a Lula.
“Basta pensar na seca para
entender esse comportamento”, disse Olivânio ao 247. A conta, no caso, é
objetiva. Numa cidade onde 6 mil pessoas residem na área rural, os programas
dos governos Lula-Dilma asseguraram a distribuição de 5 000 cisternas – seja
aquelas de tamanho pequeno, adequadas para o consumo humano, seja no tamanho
maior, ideal para a agricultura. “Chegamos a situação correta, na qual a
maioria das famílias tem duas cisternas, que permitem fazer seu trabalho e
também cuidar da saúde e da higiene”.
Destinada a reforçar a
musculatura política de Lula, alvo de uma perseguição da Lava Jato que ameaça
tirar de cena uma candidatura favorita em todas as pesquisas para 2018, a
mobilização em torno do mais popular presidente nossa história é a mais
importante novidade da política brasileira. Enquanto adversários tradicionais
se desmoralizam perante o eleitorado, a começar por Aécio Neves, Geraldo
Alckmin, João Doria e Jair Bolsonaro se encontram em cenas de canibalismo que
ninguém sabe como vai parar.
Numa situação na qual a
fragilidade dos adversários coloca em
risco a democracia, a ampliada base
popular de Lula lhe confere uma legitimidade única numa conjuntura de dúvidas e
incertezas para tirar o país da maior catástrofe econômica e política e sua
história.
247
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