Áudios mostram que merenda em SP era fraudada com alimentos baratos.
Grampos telefônicos
autorizados pela Justiça no âmbito das investigações da Operação Prato Feito,
que apura desvios de R$ 1,6 bilhão em contratos de merenda escolar de
prefeituras paulistas, constataram que empresários e gestores orientavam a
substituição de alimentos destinados aos estudantes por outros mais baratos ou
diluídos. Desse modo, a carne era substituída por ovos; leite e cereais por
biscoito e suco, e o leite era misturado com água para render mais.
“O que é chocante é ouvir
empresário dizendo para cortar a carne e fornecer ovos para as crianças”, disse
a delegada Melissa Maximino Pastor, coordenadora da Unidade de Inteligência da
Delegacia de Combate à Corrupção e Crimes Financeiros da Polícia Federal São
Paulo. Ela ressaltou que os contratos de fornecimento de merenda não eram
cumpridos integralmente para possibilitar desvio dos recursos. O áudio flagrado
ocorreu em uma negociação na prefeitura de Araçatuba, segundo a delegada.
O secretário adjunto de
Controle Interno da CGU, Roberto César de Oliveira Viegas, afirmou que somente
neste contrato da prefeitura de Araçatuba foi constatado um desvio de R$ 2,2
milhões em um contrato de R$ 3,7 milhões de repasses de recursos federais para
compra dos alimentos da merenda. “Encontramos substituição de alimentos
consideráveis, como a contratação de café da manhã aos alunos com leite e
cereais, quando eram servidos somente biscoito e suco”, ressalta Viegas.
De acordo com a PF, algumas
escolas ofereciam apenas uma bolacha e leite diluído em água aos alunos. Na
prefeitura de Araçatuba, as crianças passaram a ser proibidas de repetir
refeições e começaram a receber “pratos feitos”, o que deu nome à operação.
Segundo a delegada Melissa, o contrato estabelecia que as crianças poderiam
repetir o almoço “várias vezes, mas que, por desvio, passaram a receber somente
um prato feito”.
Segundo a delegada
responsável pela investigação, os grampos telefônicos interceptados entre os
empresários, lobistas e assessores dos prefeitos indicam ainda que ocorre o
pagamento de propina de forma contínua, mesmo sem o pretexto de ajuda para
campanhas eleitorais. “Encontramos valores depositados na conta direta de
prefeitos, de secretários, de seus parentes ou de assessores. Também usavam
empresas laranjas para tentar lavar o dinheiro da corrupção”, afirmou Melissa.
Resultado da operação
A Polícia Federal mobilizou
560 agentes de vários estados para cumprir mandados de busca e apreensão em 30
prefeituras paulistas e 29 nas empresas investigadas. Os mandados foram
cumpridos nas residências de prefeitos e ex-prefeitos, além de gabinetes e
secretarias municipais. Os pedidos atingiram 85 pessoas no total, sendo 45
agentes públicos. A força-tarefa destacou que, durante os mandados de busca e
apreensão, foram encontrados dinheiro em espécie com as autoridades
investigadas, detalhando que pretende apresentar posteriormente o total
apreendido.
O trabalho de investigação
encontrou 65 contratos sob suspeita de irregularidades, que vão desde
direcionamento dos editais de licitação entre as cinco empresas do setor até
serviços não executados ou suprimidos. “Os próprios servidores das empresas
contratadas atestavam as notas fiscais de entrega dos produtos”, destaca o
representante da CGU, ressaltando que o órgão já declarou a inidoneidade das
cinco empresas para contratação com o Poder Público nas três esferas (União,
Estados e municípios).
A investigação, que durou
três anos, apontou como responsáveis pelo desvio 13 prefeitos de municípios
paulistas, quatro ex-prefeitos, um vereador, 27 servidores públicos e 29
funcionários de cinco empresas, classificadas como um cartel que agia no setor
há mais de 20 anos. Somente a prefeitura de Araçatuba recebeu, ao longo de dois
anos, R$ 3,7 milhões do PNAE e superfaturou R$ 2,2 milhões.
Prisões indeferidas
A Polícia Federal informou
que a 1ª Vara Criminal da Justiça Federal de São Paulo indeferiu todos os
pedidos de prisão solicitados para 62 pessoas, entre agentes públicos e
representantes das empresas. "O juiz de primeira instância negou todos os
pedidos", disse a delegada Melissa, ressaltando que não foi solicitada a
prisão para nenhum dos 13 atuais prefeitos investigados.
Os investigados são
titulares das cidades de Barueri, Embu das Artes, Mauá, Caconde, Cosmópolis,
Holambra, Hortolândia, Laranjal Paulista, Mogi Guaçu, Mongaguá, Paulínia,
Pirassununga e Registro. Também são investigados os ex-prefeitos de Águas de
Lindoia, Pirassununga, Mauá e Mairinque.
“Os prefeitos serão
investigados pelo Tribunal Regional Federal da 3ª Região”, destacou a delegada,
ressaltando ainda que não foi autorizado a quebra do sigilo fiscal, bancário e
telefônico das autoridades.
Da Agência Brasil
Nenhum comentário