Dono da JBS grava Temer dando aval para compra de silêncio de Cunha.
RIO — Na tarde de
quarta-feira passada, Joesley Batista e o seu irmão Wesley entraram apressados
no Supremo Tribunal Federal (STF) e seguiram direto para o gabinete do ministro
Edson Fachin. Os donos da JBS, a maior produtora de proteína animal do planeta,
estavam acompanhados de mais cinco pessoas, todas da empresa. Foram lá para o
ato final de uma bomba atômica que explodirá sobre o país — a delação premiada
que fizeram, com poder de destruição igual ou maior que a da Odebrecht. Diante
de Fachin, a quem cabe homologar a delação, os sete presentes ao encontro
confirmaram: tudo o que contaram à Procuradoria-Geral da República (PGR) em
abril foi por livre e espontânea vontade, sem coação.
É uma delação como jamais
foi feita na Lava-Jato: Nela, o presidente Michel Temer foi gravado em um
diálogo embaraçoso. Diante de Joesley, Temer indicou o deputado Rodrigo Rocha
Loures (PMDB-PR) para resolver um assunto da J&F (holding que controla a
JBS). Posteriormente, Rocha Loures foi filmado recebendo uma mala com R$ 500 mil
enviados por Joesley. Temer também ouviu do empresário que estava dando a
Eduardo Cunha e ao operador Lúcio Funaro uma mesada na prisão para ficarem
calados. Diante da informação, Temer incentivou: "Tem que manter isso,
viu?".
Aécio Neves foi gravado
pedindo R$ 2 milhões a Joesley. O dinheiro foi entregue a um primo do
presidente do PSDB, numa cena devidamente filmada pela Polícia Federal. A PF
rastreou o caminho dos reais. Descobriu que eles foram depositados numa empresa
do senador Zeze Perrella (PSDB-MG).
Joesley relatou também que
Guido Mantega era o seu contato com o PT. Era com o ex-ministro da Fazenda de
Lula e Dilma Rousseff que o dinheiro de propina era negociado para ser
distribuído aos petistas e aliados. Mantega também operava os interesses da JBS
no BNDES.
Joesley revelou também que
pagou R$ 5 milhões para Eduardo Cunha após sua prisão, valor referente a um
saldo de propina que o peemedebista tinha com ele. Disse ainda que devia R$ 20
milhões pela tramitação de lei sobre a desoneração tributária do setor de
frango.
Pela primeira vez na
Lava-Jato foram feitas "ações controladas", num total de sete. Ou
seja, um meio de obtenção de prova em flagrante, mas em que a ação da polícia é
adiada para o momento mais oportuno para a investigação. Significa que os
diálogos e as entregas de malas (ou mochilas) com dinheiro foram filmadas pela
PF. As cédulas tinham seus números de série informados aos procuradores. Como
se fosse pouco, as malas ou mochilas estavam com chips para que se pudesse
rastrear o caminho dos reais. Nessas ações controladas foram distribuídos cerca
de R$ 3 milhões em propinas carimbadas durante todo o mês de abril.
Se a delação da Odebrecht
foi negociada durante dez meses e a da OAS se arrasta por mais de um ano, a da
JBS foi feita em tempo recorde. No final de março, se iniciaram as conversas.
Os depoimentos começaram em abril e na primeira semana de maio já haviam
terminado. As tratativas foram feitas pelo diretor jurídico da JBS, Francisco
Assis e Silva. Num caso único, aliás, Assis e Silva acabou virando também
delator. Nunca antes na história das colaborações um negociador virara delator.
A velocidade supersônica
para que a PGR tenha topado a delação tem uma explicação cristalina. O que a
turma da JBS (Joesley sobretudo) tinha nas mãos era algo nunca visto pelos
procuradores: conversas comprometedoras gravadas pelo próprio Joesley com Temer
e Aécio — além de todo um histórico de propinas distribuídas a políticos nos
últimos dez anos. Em duas oportunidades em março, o dono da JBS conversou com o
presidente e com o senador tucano levando um gravador escondido — arma que já
se revelara certeira sob o bolso do paletó de Sérgio Machado, delator que
inaugurou a leva de áudios comprometedores. Ressalte-se que essas conversas,
delicadas em qualquer época, ocorreram no período mais agudo da Lava-Jato. Nem
que fosse por medo, é de se perguntar: como alguém ainda tinha coragem de
tratar desses assuntos de forma tão descarada?
Para que as conversas não
vazassem, a PGR adotou um procedimento incomum. Joesley, por exemplo, entrava
na garagem da sede da procuradoria dirigindo o próprio carro e subia para a
sala de depoimentos sem ser identificado. Assim como os outros delatores.
Ao mesmo tempo em que
delatava no Brasil, a JBS contratou o escritório de advocacia Trench, Rossi e
Watanabe para tentar um acordo de leniência com o Departamento de Justiça dos
EUA (DoJ). Fechá-lo é fundamental para o futuro do grupo dos irmãos Batista. A
JBS tem 56 fábricas nos EUA, onde lidera o mercado de suínos, frangos e o de
bovinos. Precisa também fazer um IPO (abertura de capital) da JBS Foods na
Bolsa de Nova York.
Pelo que foi homologado por
Fachin, os sete delatores não serão presos e nem usarão tornozeleiras
eletrônicas. Será paga uma multa de R$ 225 milhões para livrá-los das operações
Greenfield e Lava-Jato que investigam a JBS há dois anos. Essa conta pode
aumentar quando (e se) a leniência com o DoJ for assinada.
O globo - Colaborou
Guilherme Amado
Nenhum comentário