MPF quer inconstitucionalidade de emenda que congelou gastos por 20 anos.
Conjunto
de argumentos foi encaminhado à procuradora-geral da República, Raquel Dodge,
que emitirá parecer na análise do tema pelo Supremo Tribunal Federal
A Procuradoria Federal dos
Direitos do Cidadão (PFDC), do Ministério Público Federal, encaminhou à
procuradora-geral da República, Raquel Dodge, um conjunto de argumentos que
procuram demonstrar a inconstitucionalidade da Emenda Constitucional 95/2016. A
medida instituiu, pelos próximos 20 anos, o corte em investimentos na área
pública - afetando, especialmente, saúde, educação e segurança social. Seis
Ações Diretas de Inconstitucionalidade já tramitam no Supremo Tribunal Federal
pedindo o fim do corte de gastos.
A manifestação à PGR foi
encaminhada ontem (5/10), data em que se comemora a promulgação da Constituição
Federal brasileira de 1988, conhecida como Constituição Cidadã. Para a
Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão, os cortes de recursos públicos
definidos pela chamada emenda do corte de gastos constituem verdadeiro desmonte
dos direitos sociais implantados pela Constituição de 1988, colocando sob risco
toda uma geração futura.
"Seus resultados sobre
os direitos humanos são devastadores. O princípio da igualdade, só possível
mediante forte investimento em políticas públicas que rompesse o quadro
histórico de privilégios da sociedade brasileira, foi atingido no seu núcleo
mais fundamental. As três principais políticas para fazer face às desigualdades
econômicas e, consequentemente, ao desequilíbrio de oportunidades, estão
comprometidas: assistência social, saúde e educação", destaca Deborah
Duprat, procuradora federal dos Direitos do Cidadão.
O documento elaborado pela
PFDC aponta que o orçamento da saúde apresenta queda de 17% em relação ao
exercício anterior, enquanto o orçamento da educação foi reduzido em 15%, para
as despesas de custeio, e em 40%, para as de investimentos. "É possível
afirmar, sem medo de errar, que a EC 95 aprofunda a miséria, acentua as desigualdades
sociais e não dá conta de preservar o conteúdo mínimo de direitos econômicos,
sociais e culturais", diz o texto.
Impactos das políticas de
austeridade - A EC 95 foi aprovada em dezembro de 2016 pelo presidente da
República Michel Temer como parte do pacote de medidas econômicas para limitar
as despesas primárias da União. No conjunto de argumentos encaminhados à
procuradora-geral da República, a PFDC destaca que a emenda fere todos os
parâmetros internacionais relativos a medidas de austeridade e que, em
situações de crise, como a que o Brasil passa, essas políticas acabam por
exacerbar iniquidades estruturais.
O entendimento tem como base
dados e estudos apresentados por instituições como o Conselho de Direitos
Humanos da ONU, o Alto Comissariado da ONU para os Direitos Humanos, o
Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc) e mesmo o Fundo Monetário
Internacional (FMI), que apontam que as políticas de austeridade não somente
geram custos sociais substanciais mas também aprofundam o desemprego - diminuindo
a capacidade de indivíduos exercerem seus direitos humanos, e os Estados, a sua
obrigação de proteger essas garantias.
"Essa diminuição na
capacidade de proteger direitos humanos é particularmente verdadeira para os
grupos mais vulneráveis e marginalizados da sociedade - incluindo mulheres,
crianças, minorias, migrantes e pobres, que sofrem pelo decréscimo de acesso a
trabalho e a programas sociais, além de verem reduzido o acesso a alimentação,
moradia, água, cuidados médicos e outras necessidades básicas".
Constituição Cidadã - A
Constituição Federal de 1988 trouxe, ao lado do princípio da igualdade
material, um forte investimento em políticas públicas, de modo a possibilitar o
combate à redução das desigualdades sociais.
"A Emenda
Constitucional 95 modifica substancialmente o pacto constituinte e, com isso, o
núcleo identitário da Constituição de 1988. Isso porque o ajuste fiscal será
suportado pela parcela mais desfavorecida da sociedade brasileira, aprofundando
o fosso da desigualdade e aumentando os bolsões de pobreza e miséria. Seus
impactos, que já podem ser projetados imediatamente a partir da Lei
Orçamentária de 2018, serão potencializados por conta de sua extensão
temporal".
Projeções do Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) revelam que, em 2036, a população
brasileira terá um crescimento de, pelo menos, 20 milhões de pessoas, com
aumento significativo da população idosa, provavelmente o dobro da que se tem
hoje - o que representa maior demanda por serviços de saúde. Diante desse
quadro, a despesa per capita não será apenas congelada, mas sofrerá redução.
"Se atualmente o País
carece de serviços públicos nessa área, que sofre de subfinanciamento crônico,
imagine-se a situação caótica que se instalará com o referido incremento
populacional, mas sem possibilidade de aumentar a disponibilidade de serviços,
dadas as limitações orçamentárias impostas pela EC 95", questiona a PFDC.
Procuradoria Federal dos
Disreitos do Cidadão/MPF
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