Sheila Bellaver saiu da lavoura e vive sonho de criança: ser caminhoneira.
“Quando era criança, queria
ir embora com as jamantas”, conta Scheila Rosa Marchiori sobre a infância na
lavoura, no interior do Rio Grande do Sul, onde nasceu a paixão pelos
caminhões.
Nem ela sabe de onde veio o
sonho, ninguém na família era motorista, ela nem costumava ver esse tipo de
veículo com frequência. Mas em nome desse desejo de infância, superou
inexperiência, portas fechadas e o desafio de conciliar a estrada e a
maternidade para se tornar Sheila Bellaver, a caminhoneira mais famosa do
YouTube no Brasil.
Com visual de "musa da
academia", ela tem um canal com 300 mil seguidores onde mostra as viagens,
conta desventuras e faz reflexões enquanto roda por todo o país guiando,
sozinha, um Scania R480 Highline.
Sheila cresceu na lavoura e
se casou aos 15 anos. Logo teve os filhos gêmeos, depois uma filha. Mas a
paixão pelos caminhões nunca acabou. “Meu marido não admitia que eu sonhasse,
falasse de caminhão.”
Para ganhar um pouco de
independência, conseguiu um emprego como costureira. Mas, no dia seguinte, foi
se inscrever na autoescola para tirar a carteira de habilitação, primeiro para
carro (categoria B) – obrigatória para quem quer tirar a CNH para dirigir
veículos maiores.
Dali foi para a categoria C
e achou “que já era motorista”. Deixou o emprego e passou a procurar a vaga,
mas as portas estavam todas fechadas.
Decidiu ir além: “Vi que
tinha que me aprimorar, precisava tirar a E”, categoria de habilitação para
dirigir caminhões cujo reboque tenha mais do que 6 toneladas.
Mesmo assim, não conseguia
uma chance. Acabou ficando deprimida, conta.
“Ninguém queria dar
oportunidade, jovem, corpo bonito, 3 filhos pequenos.”
Cinco anos se passaram até
conseguir uma oportunidade. “E foi por favor, por meio de um amigo do meu pai”.
A primeira missão era levar
uma carga para o interior de São Paulo. Um dos patrões a acompanhou no carregamento
da carga: 27 mil kg de suco em tambor.
“Ele ia explicando os
comandos do caminhão, como fazia tudo. Já sai de lá errando marcha, apagando o
caminhão...”, lembra. “Chegando lá (à empresa), ele saiu correndo (do caminhão)
e disse que não sabia o que assustava mais: se era eu não saber dirigir ou não
saber onde era São Paulo.”
Mas quem a contratou
insistiu na chance. Ela chegou àquele e a muitos outros destinos. Em 15 dias,
estava no Nordeste. “Chorava de emoção” na primeira viagem, lembra.
Sheila trabalha há 8 anos na
mesma empresa, de onde vem o nome Bellaver, transportando frutas e verduras por
todo o Brasil. ‘Sempre demonstraram muito orgulho de mim, o quanto eu lutei”,
reconhece.
O único momento difícil foi
um acidente sofrido perto do Natal passado, quando a carreta quase fechou na
temida posição de L por causa de combustível na pista.
“Eu consegui desfazer o L,
senão ia atingir outros carros, o movimento era intenso”, conta.
O caminhão acabou deslizando
até parar na cabeceira da ponte, derrubando a proteção e ficando alinhado a um
penhasco. Ninguém se machucou.
Supermãe à distância
Há 2 anos, Sheila começou a
gravar e postar vídeos das viagens. Neles aparecem também o filho caçula de 1
ano e 2 meses, do segundo casamento com um engenheiro que também é
caminhoneiro.
Quando ela está na estrada,
o bebê fica com os sogros. Os filhos maiores, com 18 e 16 anos, ela controla à
distância.
"Eles me pedem tudo, se
pode ir a um lugar, a outro. Sou muito apavorada, ligo o dia inteiro, atormento
a vida deles”, conta. “Hoje mesmo estou a 1.600 km de casa. Mas estou sabendo
de tudo.”
“Tem pessoas que julgam você
por estar longe. Só que, às vezes, sou mais mãe do que quem está em casa. Tem
pessoas que estão em casa só com o corpo, a alma está longe.”
Roupa 'não faz caráter'
Aos 35 anos, além de
realizar um sonho, Sheila diz que conquistou respeito, inclusive dos colegas.
E, sobretudo, a liberdade.
“Na viagem, ninguém mexe
comigo: a roupa não faz o caráter. Ninguém me falta com respeito.”
Ela diz que recebe muitas
mensagens de admiradoras. “Quanta menininha me segue! A maioria é mulher, é
muito gratificante”, relata. Enquanto fazia as fotos que ilustram a reportagem,
um casal de fãs chegou para pedir selfies, às margens da Rodovia Anhanguera, em
São Paulo.
A estrada deu muitas
realizações para Sheila. "Todos os lugares que eu sonhava em conhecer, eu
conheci. Todos os que eu via na televisão”, afirma.
Conhecida pelo Brasil afora,
ela mesma já se viu na TV. O próximo sonho é mais modesto e está perto de
acontecer: “Vou ter um caminhão rosa”.
G1
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