Presidente da Camargo Corrêa diz que pagou propina na ferrovia Norte-Sul.

As declarações foram feitas em
depoimento de delação premiada aos investigadores da Operação Lava-Jato. Na
Norte-Sul, a empreiteira participou de contratos no valor de R$ 1 bilhão,
assinados em 2010 com a Valec, estatal ligada ao Ministério dos Transportes que
administra as ferrovias brasileiras. As informações foram obtidas pelo GLOBO.
Com essas revelações, as investigações podem chegar a novos executivos das
empreiteiras.
Em prisão domiciliar desde
segunda-feira, Avancini detalhou a existência, na Norte-Sul, de um esquema
similar ao “Clube das Empreiteiras”, que determinava quais empresas venceriam
as licitações na Petrobras. Os investigadores querem saber se as regras do
cartel eram idênticas ao esquema coordenado pelo presidente da UTC, Ricardo
Pessoa, na estatal de petróleo. Além da Camargo, entre as empresas envolvidas
estariam outras investigadas na Lava-Jato como Constran, ligada à UTC, Andrade
Gutierrez e Queiroz Galvão.
O executivo da empreiteira afirmou
ainda que a distribuição de propinas seguia regras similares ao esquema montado
na Petrobras. Durante as investigações da Lava-Jato, a Polícia Federal e o
Ministério Público Federal revelaram que 1% dos contratos da estatal com as
empresas do cartel abasteciam partidos políticos e agentes públicos. Em caso de
aditivos, os valores poderiam chegar a 5%.
O executivo será chamado a depor
novamente para esclarecer como eram feitos os pagamentos e o valor das
propinas. O testemunho específico sobre a Norte-Sul deverá ser marcado para
antes do interrogatório sobre a Petrobras, agendado para maio.
As revelações de Avancini ampliaram
as investigações da Lava-Jato para contratos além dos da Petrobras. Em março, O
GLOBO revelou que o presidente da Camargo Corrêa confirmara o pagamento de R$
100 milhões em propina para obter contratos de obras na usina de Belo Monte.
Ainda segundo Avancini, o valor foi dividido entre PT e PMDB: cada um dos
partidos receberia 1% do valor dos contratos.
Em outubro de 2010, a Valec anunciou
os nomes dos consórcios de empreiteiras que venceram licitação para executar a
construção de um trecho de 669 quilômetros da Ferrovia Norte-Sul, entre Ouro
Verde (GO) e Estrela d'Oeste (SP) — um negócio de R$ 2,3 bilhões divididos em
cinco lotes. A Camargo Corrêa se uniu à Queiroz Galvão através do Consórcio
Ferrosul e venceu os lotes 2 e 3 que, somados, custaram R$ 1 bilhão. Mesmo
vencedora, a Camargo teria aberto mão do contrato e, após a vitória, a obra do
lote 2 foi assumida pelo segundo colocado na concorrência: o consórcio
Pavotec/Ourivio/Tejofran/Fuad Rassi/Sobrado. Os investigadores vão apurar como
se deu o pagamento de propina nesses dois contratos, inclusive com a saída da
Camargo.
Além da Ferrosul, outros três grupos
conquistaram os contratos para a construção do trecho Ouro Verde-Estrela
d'Oeste. O primeiro lote foi vencido pelo grupo formado por Aterpa e Ebate, ao
custo de R$ 387,7 milhões. O lote 4 ficou a cargo do consórcio Constran, Egesa
e Carioca, por R$ 520 milhões. O quinto ficou com a Tiisa Triunfo Iesa
Infraestrutura, por R$ 434,3 milhões.
Ano passado, um relatório do
Tribunal de Contas da União (TCU) identificou superfaturamento e sobrepreço em
obras referente ao trecho entre Porto Seco de Anápolis (GO) e Pátio de Uruaçu
(GO). As irregularidades somadas chegam a R$ 176 milhões. Entre as obras
executadas pela Camargo Corrêa, o montante superfaturado foi de R$ 45 milhões,
segundo as contas do TCU.
EMPRESAS NEGAM CORRUPÇÃO
As construtoras citadas por Avancini
em sua delação premiada repudiaram as acusações de formação de cartel nas obras
da Ferrovia Norte-Sul e negaram o pagamento de propina a políticos. A Camargo
Corrêa divulgou nota dizendo que “não tem acesso ao referido acordo de
colaboração, desconhece seus termos e também o teor dos depoimentos. A empresa
reitera que permanece à disposição das autoridades”.
Já a Andrade Gutierrez disse em nota
que “repudia falsas acusações que vêm sendo feitas e reitera, como tem feito
desde o início da Operação Lava-Jato, que não tem ou teve qualquer envolvimento
com os fatos investigados”. “É importante ressaltar que não há qualquer tipo de
prova sobre a participação da AG em pagamentos indevidos de recursos a
políticos e ou a quaisquer outras pessoas. Todas as acusações equivocadas vêm
sendo feitas em cima de ilações e especulações, sem qualquer fato ou prova
concreta”, completa o texto da empreiteira.
A Queiroz Galvão também negou
“veementemente qualquer pagamento ilícito a agentes públicos para obtenção de
contratos ou vantagens”. “A companhia reitera que todas as suas atividades
seguem rigorosamente à legislação vigente”, diz a empresa, em nota, ao GLOBO. A
Constran/UTC disse que “não comenta investigações em andamento”.
A Valec disse que não foi notificada
sobre o conteúdo da delação do executivo e que desconhece os fatos citados.
Também destacou que a atual diretoria está à frente do órgão há dois anos.(Colaboraram
Germano Oliveira e Sérgio Roxo)
O Globo
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