Pacientes com câncer precisam de apoio para vencer a doença.
Líverson Souza da Silva
tinha 22 anos quando recebeu o primeiro comprimido quimioterápico, minutos
depois de ouvir o diagnóstico de leucemia no Instituto Estadual de Hematologia
do Rio de Janeiro, em 30 de dezembro de 2010. Ele foi internado naquele mesmo
dia, e só saiu do hospital dois meses depois.
Esse foi o início de seu
tratamento de quatro anos contra a doença, que é tema de mobilização
internacional neste domingo (4), com o Dia Mundial do Câncer.
A leucemia de Líverson está
em remissão, período em que a doença desapareceu, mas o paciente continua em
observação para que um possível retorno seja diagnosticado rapidamente. De sua
experiência, esse carioca destaca o engajamento das pessoas à sua volta e
também os sacrifícios necessários para ajudá-lo.
"Quando a gente fala de
um câncer, não é só a pessoa que fica doente, é a comunidade em volta
dela", diz ele. Sua mãe precisou parar de trabalhar para acompanhá-lo em
consultas e internações, e amigos organizavam rifas e festas para ajudar sua
família financeiramente.
Ao receber alta de sua
primeira internação, ele precisou morar de favor na casa de um tio, porque sua
casa era uma construção antiga, com mofo e infiltrações que prejudicariam a
saúde de uma pessoa já debilitada.
"Eu tinha pouca
intimidade com ele [o tio], só via uma, duas vezes por ano, apesar de ser um
cara muito bacana. Mesmo assim, ele separou um quarto e passei um ano e meio,
quase dois anos morando com ele". O apoio da família em casos como o de
Líverson, na avaliação da diretora-geral do Instituto Nacional do Câncer José
Alencar Gomes da Silva (Inca), Ana Cristina Pinho Mendes, é determinante.
"A maneira como o
indivíduo e seus familiares lidam com o câncer é definitiva até para o próprio
prognóstico e os resultados dos tratamentos", diz a diretora do órgão, que
iniciou uma campanha para reduzir a estigmatização da doença e desconstruir a
ideia de que ser diagnosticado com câncer é receber uma sentença de morte.
"No ambulatório, a
gente vê pessoas que nem mencionam a palavra câncer. Familiares que tapam a
boca, falam “aquela doença”, “aquele problema” e nem verbalizam. O fato é que
hoje o câncer é completamente diferente do que era há 10 anos, há 15 anos. Os
tratamentos são múltiplos e complementares".
O apoio multidisciplinar
recebido durante o tratamento fez Líverson buscar o curso de Psicologia. Seu
primeiro Exame Nacional do Ensino Médio foi ainda em condições especiais, nas
dependências do HemoRio. Ele não passou e, na segunda tentativa, conseguiu uma
bolsa integral para estudar em uma faculdade privada, onde já está no sétimo
período.
"No final do
tratamento, eu comecei a trabalhar voluntariamente em uma ONG [organização não
governamental], e foi onde conheci minha atual esposa, que desenvolve trabalho
voluntário comigo até hoje, na ONG Pró-Humanos", afirma ele, que se casou
no ano passado, aos 29 anos, e alugou um apartamento em Guaratiba, na zona
oeste do Rio. Seus planos são se formar, se estabilizar financeiramente e ter
filhos.
Boatos e cuidados com o
corpo
Uma mudança que o câncer
trouxe para a cabeleireira Fabiani Monteiro, de 43 anos, foi observar e cuidar
melhor do corpo. Quando foi diagnosticada com câncer de mama, aos 39 anos, ela
conta que nunca realizava o autoexame e se apavorou ao se deparar com um nódulo
de oito centímetros.
Com a doença em remissão há
três anos, ela tenta passar essa experiência a outros pacientes, trabalhando na
ONG Renascer.
"Hoje em dia, eu chamo
muita atenção das mulheres para isso. Eu poderia ter descoberto esse nódulo
mais precocemente e o dano seria bem menor", diz ela, que também defende
que o acolhimento e a positividade das pessoas mais próximas são fundamentais.
"Atrapalha muito quando
você vê que aquela pessoa ao seu lado não acredita que você vai ser curada.
Quando você vê, ela se entrega à ideia de que você vai morrer e aquilo vai te
consumir". Durante o período em que esteve doente, ela lembra que ouvia
frequentemente conselhos absurdos.
"A gente escuta muita
coisa. Você vai criando uma bolha e acaba perdendo ainda mais a sua qualidade
de vida", confessa ela, que acredita que o paciente com câncer, ao receber
o diagnóstico, precisa ter cuidado com a busca desesperada por informações.
"O momento do
diagnóstico é o susto. Você quer correr atrás do seu prejuízo e buscar a cura
pelos seus meios. É quando você começa a procurar no doutor Google e acha
informações que não procedem".
O combate a notícias falsas
e a boatos sobre a doença é um dos focos do Inca este ano, o que motivou a
realização de um debate na sede do instituto na última sexta-feira (2).
Para a diretora-geral do
Inca, o combate aos boatos representa uma forma de prevenir o câncer, porque a
consequência muitas vezes é afastar os pacientes dos tratamentos corretos e
criar falsas expectativas: "Isso gera ansiedade, gera muitas vezes expectativas
irreais, fantasiosas e frustração porque não funcionam. É preciso que a
informação correta chegue ao paciente e quanto mais informação, mais preparado
o paciente estará para enfrentar a doença", argumenta.
Para tirar dúvidas e
desmentir boatos, a Fundação do Câncer, entidade sem fins lucrativos, parceira
do Inca, terá um consultório online, que será transmitido ao vivo durante este
domingo no Facebook da instituição.
Oito profissionais da área
da saúde, entre médicos oncologistas de todas as especialidades e enfermeiros,
estarão à disposição da sociedade, falando das ações de prevenção do câncer,
tipos de câncer mais frequentes e inovações em termos de tratamento.
*Colaborou a repórter Alana
Gandra da Agência Brasil
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