Abatido por crise, presidente Temer perde governabilidade.
A tinta da caneta do
presidente Michel Temer (foto), está secando e o brilho dela já é uma vaga lembrança.
Em outros anos eleitorais, o poder presidencial de sanção ou veto, de liberação
de emendas, autorização de obras e demais medidas voltadas para a população
criaram uma estrutura política capaz de garantir votos e a reeleição. Mas não é
para este rumo que o governo federal se encaminha. E a paralisação dos
caminhoneiros foi o xeque-mate. A demora em perceber e reagir aos protestos escancarou
uma situação de fragilidade que, agora, compromete a capacidade de aprovar
medidas no Congresso. E tudo se encaminha para a perda da capacidade do MDB em
ser o protagonista na união do centro em torno da pré-candidatura de Henrique
Meirelles, ex-ministro da Fazenda.
O governo se esforça para
criar a narrativa de que está fortalecido. Há duas semanas, prometeu entregar,
até o fim do ano, 700 mil imóveis do Minha Casa, Minha Vida e autorizou crédito
para financiamento e conclusão de obras em Santa Catarina. Ao fim de abril,
reajustou o Bolsa Família em 5,67% — quase o dobro da inflação do ano anterior.
Mas não consegue impulsionar a pré-candidatura do MDB e emplacar a imagem de
uma gestão forte.
As suspeitas de Temer ter beneficiado
empresas no setor portuário em troca de propina, conforme investigações da
Polícia Federal, são os principais motivos do enfraquecimento do poder do
presidente, pondera o cientista político Cristiano Noronha, sócio da Arko
Advice. O campo econômico também não anima. O mercado de trabalho não deslancha
e o desemprego continua subindo, apesar de crescimento dos empregos formais.
Assim, menos pessoas têm renda para gastar e ter uma sensação de conforto
social. No campo fiscal, as despesas do governo continuam subindo acima das
receitas. O impacto disso fragiliza ainda mais a tinta da caneta presidencial
de anunciar investimentos em obras, por exemplo.
Em meio a tantos problemas,
veio a paralisação dos caminhoneiros. O governo foi alertado sobre os protestos
e não adotou diálogos preventivos. Mesmo após o início das manifestações, na
segunda-feira, as negociações entre o Palácio do Planalto e a categoria
começaram apenas na quarta-feira. Tarde demais. Na manhã do dia seguinte,
começaram os relatos de desabastecimento nas principais cidades do país. “Um
governo fragilizado acaba ficando com dificuldades de negociar com o Congresso.
Agora, pode enfrentar dificuldades em emplacar algumas medidas provisórias”,
afirma.
Aos poucos, os sinais de
perda de apoio no Congresso estão surgindo. Na terça-feira à noite, o
presidente da Câmara, Rodrigo Maia, retirou da pauta da Câmara a MP que trata
sobre a privatização da Eletrobras. Um exemplo sintomático do esgotamento da
caneta de Temer. “O que possuía de emenda (parlamentar) já foi liberada. Também
já não tem mais muitos cargos para oferecer”, adverte Noronha.
A divisão interna no MDB
também não ajuda a estrutura política do governo. Sobretudo após Temer ter
sugerido que saia do partido quem não apoiar Meirelles. O discurso pegou mal
entre caciques, como o presidente do Senado, Eunício Oliveira (CE). O
vice-líder do governo na Câmara, Beto Mansur (MDB-SP), no entanto, nega um
enfraquecimento. “Não acho que perde base ou fica fragilizado. É algo que
acontece. Acho até que a gente perdeu um pouco a possibilidade de ter um
programa de regulação de preços de combustíveis no Brasil, mas vamos fazer
agora”, destaca.
Expectativa
A união do centro em torno
de Meirelles se torna um sonho cada vez mais distante em vista do
enfraquecimento do governo. Se havia uma expectativa de usar a caneta para a
construção de moradias do programa Minha Casa, Minha Vida, e autorização de
recursos para estados e municípios, o mesmo não se pode esperar após os
acontecimentos da greve dos caminhoneiros. Sobretudo após o crescimento de Maia
no cenário.
O presidente da Câmara
comandou a sessão que, na quarta-feira à noite, aprovou o projeto de
desoneração da folha de pagamento, que possibilitará a redução de R$ 0,05 sobre
o óleo diesel mediante a eliminação da Cide. O efeito prático é pequeno, mas
transmitiu às lideranças dos caminhoneiros, um dia depois, uma sensibilidade
maior que a do governo para colocar fim à paralisação.
Na mesma quinta-feira,
pressionado, o governo anunciou um acordo com a maioria dos representantes da
categoria, mas precisou recorrer às Forças Armadas em decisão anunciada na
sexta-feira para prevalecer o trato. O presidente da Associação Brasileira dos
Caminhoneiros (Abcam), José da Fonseca Lopes, disse “não acreditar mais nas
promessas do governo” ao negar o acordo.
O DEM, no entanto, evita
tratar a atuação de Maia como uma vitória sobre Temer. Mas integrantes do
partido admitem que, ao marcar posição no impasse, o presidente da Câmara
conseguiu crescer no centro. É o que avalia o deputado Efraim Filho (PB),
vice-líder do DEM na Câmara. “Rodrigo agiu na condição de presidente (da Casa).
Porém, isso transmitiu à sociedade a capacidade que ele tem de conduzir o país
nas adversidades”, pondera. A análise é endossada pelo líder do partido no
Senado Federal, Ronaldo Caiado (GO). Para ele, o presidenciável conseguiu
elevar o cacife político. “Pode unir o centro, não tenho dúvida. Rodrigo teve
uma ação inteligente e articulada”, sustenta.
Momento difícil
Veja as dificuldades
enfrentadas nos últimos dias pelo governo de Michel Temer.
» Alíquota da Cide sobre o
diesel zerada até o fim do ano
» Redução do preço do diesel
em 10% por 30 dias. O valor ficará fixo em R$ 2,10 nas refinarias pelo período
» Ajustes a cada 30 dias do
preço do combustível, conforme a política de preços da Petrobras, e fixação por
mais um mês
» Garantia de que não haverá
reoneração da folha de pagamento do setor de cargas
» Reedição da tabela de
frete a cada três meses
» Extinção de ações judiciais
contrárias ao movimento
» Negociação de multas
aplicadas aos caminhoneiros em decorrência da paralisação
» Reuniões periódicas entre
as entidades representantes da categoria e o governo
» Contratação, pela
Petrobras, de caminhoneiros autônomos como terceirizados para prestação de
serviços
Rodolfo Costa/Correio
Braziliense
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