Justiça atende MPs e garante prioridade de pessoas idosas na vacinação contra a covid-19, na PB.
Novas doses destinadas ao
estado devem ser direcionadas exclusivamente às pessoas idosas até se atingir
meta geral de vacinação desse público.
Em decisão liminar,
proferida nesta segunda-feira (15/2), a Justiça Federal atendeu petição dos
três ramos do Ministério Público na Paraíba (Federal, Estadual e do Trabalho),
garantindo prioridade de vacinação contra a covid-19 para o público idoso de todas
as faixas, a partir de 60 anos, no estado. A vacinação dos demais trabalhadores
da saúde, que não atuam na linha de frente do combate ao coronavírus, deve ser
retomada quando for atingida a meta geral de vacinação do público idoso de
todas as faixas, a partir de 60 anos, determina a liminar. O pedido ministerial
buscou resguardar a população idosa, público com elevado risco de morte.
Na decisão, a juíza federal
Wanessa Figueiredo dos Santos Lima também determinou a suspensão temporária da
vacinação de outros trabalhadores da saúde que não atuem na linha de frente da
pandemia, com exceção dos que já tiverem recebido a 1ª dose, os quais, conforme
a decisão, poderão receber a 2ª dose mediante apresentação do cartão de
vacinação com o primeiro registro.
A magistrada declarou que,
no atual momento da campanha de vacinação, o termo "trabalhadores da
saúde", constante no Plano Nacional de Operacionalização da Vacinação
contra a Covid-19 e nos atos estaduais e municipais editados para sua
aplicação, deve ser interpretado como “aqueles que estejam na linha de frente
do combate à pandemia da covid-19”.
A decisão fixa multa diária
de R$ 10 mil, até o limite de R$ 300 mil, em desfavor da União, do estado da
Paraíba e do município de João Pessoa, por dia de descumprimento, e multa
pessoal de R$ 500,00, por dia de atraso, para os respectivos gestores, até o
limite de R$ 15 mil.
Desproporção gritante
O pedido liminar, feito em
aditamento (acréscimo) à petição inicial, ajuizada no dia 5 de fevereiro deste
ano, assinada por 15 membros representantes do Ministério Público Federal
(MPF), Ministério Público da Paraíba (MP/PB) e Ministério Público do Trabalho
(MPT). Eles ressaltam a desproporção de atendimento entre os dois públicos -
trabalhadores da saúde e as pessoas idosas - nessa primeira fase da campanha de
vacinação e citam dados extraídos do portal da transparência do município de
João Pessoa, evidenciando que, até o momento de protocolização do pedido na JF,
teriam sido vacinados 19.672 trabalhadores da saúde e apenas 2.000 idosos acima
de 80 anos.
Conforme é possível inferir,
a partir da Nota Técnica nº 2, de 25 de janeiro de 2021, da Gerência Executiva
de Vigilância em Saúde da Secretaria Estadual de Saúde da Paraíba,
aparentemente, esse quantitativo de trabalhadores já vacinados abrange todos os
trabalhadores da linha de frente no estado. No caso de alguns municípios (como
João Pessoa, Campina Grande e outros) “a quantidade de vacinas estimadas e
enviadas para um total de 61% (34% num primeiro momento e mais 27% num segundo
momento) desse público, acabou por ultrapassar o grupo de trabalhadores que
atuam na chamada linha de frente de atendimento à pandemia”, apontam os órgãos
ministeriais.
Na petição, também
apresentam planilhas, encaminhadas pela Secretaria de Estado da Saúde (SES),
segundo as quais, o total estimado de trabalhadores da saúde na Paraíba seria
de 126.335, sendo que os idosos com mais de 80 anos no estado somariam 92.351,
dados que mostram “o descompasso no atendimento de idosos, quando o plano
nacional lhes confere prioridade maior diante dos altos índices de mortalidade
do segmento”, apontam e argumentam que “seria perfeitamente viável ter atingido
um maior público idoso, pelo menos na faixa de mais de 80 anos, se [tivesse
sido] limitada a vacinação dos trabalhadores da saúde apenas aos que estão na
linha de frente”.
Idosos são maiores vítimas
Os MPs citam resolução da
Comissão Intergestores Bipartite da Paraíba (CIB), lavrada em reunião
extraordinária, realizada em 25 de janeiro deste ano, que decidiu pela
antecipação da oferta da vacina para o público prioritário acima de 80 anos com
as doses da Covishield (Astrazeneca). A decisão da comissão tomou por base que,
dos 4.056 óbitos por covid na Paraíba, 3.080 foram de pessoas com 60 anos ou
mais, ou seja, até o momento de confecção do pedido de aditamento, 75,93% dos
óbitos na Paraíba foram de pessoas idosas.
Os órgãos ministeriais
apontam o dado como tão preocupante, que na mesma resolução, a CIB vaticinou:
"Números mostram que a taxa de mortalidade dos idosos acima de 80 anos
(1.337,29 óbitos/100 mil hab.) é 13 vezes maior que a taxa de mortalidade
estadual (98,71 óbitos/100 mil hab.); bem como 31% (1.235/3.987) dos óbitos
ocorreram nessa faixa etária, de acordo com os dados do Sivep." O Sistema
de Informação de Vigilância Epidemiológica da Gripe (Sivep) é ferramenta de
dados do Ministério da Saúde (MS) que auxilia no mapeamento epidemiológico.
Conforme registra a petição,
o município de João Pessoa, que concentra a maior parte dos óbitos decorrentes
da infecção pandêmica, reflete um quadro semelhante: “Do total de 1.105 óbitos
confirmados, 74% das vítimas tinham mais de 60 anos de idade, sendo,
aproximadamente, 40% para indivíduos acima de 90 anos; 25% entre 80 e 90 anos;
e 15% entre 70 e 80 anos (dados da Vigilância Epidemiológica e Secretaria
Municipal de Saúde de João Pessoa)”.
Os órgãos fiscais da lei
ainda acrescentam que, no caso do Brasil, existe a previsão legal expressa
contida nos artigos 3º e 33 da Lei 10.741/2013 (Estatuto do Idoso), no sentido
de que é obrigação da sociedade e do Poder Público assegurar aos idosos, com
absoluta prioridade, a efetivação, dentre outros, do direito à vida e à saúde.
“Logo, referido dispositivo deve ser sempre considerado na elaboração de
qualquer estratégia ampla de promoção à saúde, como a de que ora se trata”,
orientam os MPs.
Paraíba x outros estados –
Mesmo diante de dados que demonstram a mortalidade da população idosa pela
covid no estado e da escassa quantidade de imunizantes disponíveis, a Paraíba,
conforme alertam os órgãos ministeriais, decidiu antecipar a vacinação de apenas
uma parcela da população - a da faixa etária acima de 80 anos. “Enquanto a
esmagadora maioria dos idosos ainda permanece não alcançada nesta primeira fase
da vacinação (...) “outros estados da federação, como Rio de Janeiro,
Pernambuco, Alagoas, Distrito Federal, Rondônia, Ceará, Acre e Amazonas, já
iniciaram a vacinação de sua população idosa não institucionalizada, apesar da
mesma limitação de quantitativo de doses disponibilizadas pelo Ministério da
Saúde”, apontam na petição.
Falhas no Plano Nacional de
Imunização
Para justificar a vacinação
“a todo vapor” de trabalhadores da saúde que não estão na linha de frente do
combate ao coronavírus, em detrimento da lenta e tímida vacinação do público
diminuto de idosos – grupo mais fragilizado e vulnerável à covid-19, com mais
alto índice de mortalidade -, os órgãos de saúde estadual e municipal alegam
como fundamento as orientações do Ministério da Saúde para a execução do Plano
Nacional de Operacionalização da Vacinação Contra a Covid-19.
Ocorre que, ao averiguar o caso, os órgãos ministeriais constataram falhas no texto dos informes e notas técnicas complementares ao referido plano. Como exemplo, citam que ali se sugere que seriam prioritários apenas os trabalhadores de saúde da chamada linha de frente de combate à pandemia. “No entanto, o Ministério da Saúde acabou incluindo na ordem de prioridade também uma expressão que abrange todo um universo (para além da chamada linha de frente), qual seja: ‘demais trabalhadores da saúde’”, apontam.
Além disso, na primeira
versão do plano, os idosos com mais de 75 anos figuravam expressamente na
primeira fase da campanha, tendo sido suprimidos posteriormente, de modo que o
público idoso foi “excessivamente restringido, num primeiro momento, apenas aos
institucionalizados”.
Os órgãos fiscais da lei
constataram, ainda, que estão sendo vacinados em todo o país trabalhadores de
saúde que, conforme amplo conceito estabelecido no plano, têm pouca exposição
ao risco de contágio, em comparação com os que estão na linha de frente do
combate à pandemia. Assim, afirmam que, embora o primeiro objetivo do plano
nacional seja reduzir mortalidade, o grupo mais vulnerável e sujeito a óbito
(idosos) acabou ficando em segundo plano “em benefício de extenso grupo de
trabalhadores em saúde que sequer compõem a força de trabalho específica de
combate à pandemia”.
A respeito dos confusos
critérios de vacinação definidos no plano nacional de vacinação, o MPF na
Paraíba, por meio do Gabinete Integrado de Acompanhamento à Epidemia do Coronavírus-19
(Giac) da Procuradoria Geral da República, encaminhou pedido formal de
esclarecimentos ao Ministério da Saúde. O mesmo questionamento foi apresentado
ao secretário de Vigilância em Saúde do MS e à coordenadora do Programa
Nacional de Imunização, durante reunião virtual, no último dia 9 de fevereiro,
realizada pelo Giac. No entanto, a distorção apontada não foi esclarecida pela
equipe do Ministério da Saúde.
Para o Ministério Público,
“se tivesse sido restringido rigorosamente o alcance da vacinação para a
categoria de trabalhadores em saúde, de modo a efetivar recorte dos
efetivamente expostos a contato com pacientes direta e frequentemente (na
chamada linha de frente), certamente poderia ter sido contemplado, desde logo,
um grupo muito maior de idosos do que apenas o reduzidíssimo segmento dos ditos
institucionalizados”, argumentam os órgãos ministeriais.
Correção da distorção – Os
três ramos do Ministério Público pedem a correção dessa distorção, com a
suspensão imediata da vacinação dos trabalhadores que não atuam na linha de
enfrentamento ao coronavírus e direcionamento exclusivo das novas remessas de
vacina contra a covid-19 aos idosos com mais de 60 anos, “ao menos para o
estado da Paraíba”. Assim, pediram que a Justiça Federal fixasse interpretação
corretiva dos planos federal, estadual e municipal de vacinação, para se
reconhecer prioridade dos idosos sobre os demais trabalhadores da saúde (que
não estejam na linha de frente do combate à pandemia).
Ação Civil Pública nº
0801065-24.2021.4.05.8200
Confira a íntegra da decisão liminar
Ascom/MPPB
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