Erros de higiene na cozinha colocam a saúde em risco, aponta pesquisa.
Estudo analisou as medidas de
manipulação e armazenamento de alimentos.
No Brasil, entre 2000 e 2018,
foram registrados, oficialmente, 247.570 casos de doenças transmitidas por
alimentos (DTA), com 195 mortes, segundo dados do Ministério da Saúde. E a
origem principal da contaminação é a cozinha da casa dos contaminados.
Para entender o fenômeno, os
pesquisadores do Centro de Pesquisas em Alimentos, o Food Research Center
(FoRC), da Faculdade de Ciências Farmacêuticas da Universidade de São Paulo
(USP), realizaram um estudo para analisar os hábitos de higiene e práticas relativas
à higienização, manipulação e armazenamento dos alimentos nas residências dos
brasileiros.
Os resultados mostram que uma
parcela expressiva da população adota medidas inadequadas. Portanto, está mais
exposta às DTA. Feita com 5 mil pessoas de todos os estados, a maioria mulheres
entre 25 e 35 anos de idade e com renda entre quatro e dez salários mínimos, a
pesquisa também verificou as temperaturas das geladeiras de 216 residências no
estado de São Paulo.
Dos ouvidos, 46,3% disseram ter o
hábito de lavar carnes na pia da cozinha, 24,1% costumam consumir carnes
malcozidas e 17,4% consomem ovos crus ou malcozidos em maioneses caseiras e
outros pratos.
O coordenador da pesquisa,
Uelinton Manoel Pinto, professor da USP e integrante do FoRC, alerta que lavar carnes,
especialmente a de frango, na pia da cozinha, pode espalhar potenciais
patógenos no ambiente, representando uma prática de risco.
A auxiliar de limpeza Francisca
Alves de Melo, ainda tem esse hábito. “Carne vermelha eu não costumo lavar, mas
carne de porco, frango, normalmente eu lavo antes de cozinhar”. Ela ressalta,
no entanto, que nunca teve doença por má conservação.
Ela lava tudo que guarda na
geladeira. “Quando eu chego da feira ou sacolão, o que é de geladeira eu lavo
com águia e sabão. Por exemplo, batata, cenoura, coloco nas sacolinhas e
armazeno. Antes de consumir, eu lavo as frutas e verduras, mas chegar e lavar
pra deixar na fruteira não, só na hora do consumo. Também lavo as latas [de
conservas].”
A auxiliar de copa Ivoneide
Holanda da Silva disse que tem os mesmos hábitos da colega, mas lava a carne de
frango. “Lavo tudinho, mas a carne vermelha não”.
Alimentos malcozidos
Segundo o professor Uelinton
Pinto, o consumo de alimentos de origem animal malcozidos ou crus também
apresenta risco microbiológico, já que o recomendado é cozinhar o alimento a
uma temperatura mínima de 74°C para garantir a inativação de patógenos que
podem estar presentes no produto cru.
“Nem todo produto cru de origem
animal contém micro-organismos patogênicos, mas existe esse risco, e o
cozimento adequado garante que esses micro-organismos sejam eliminados ou
reduzidos a níveis seguros”, explica o pesquisador.
Com respeito às práticas de
higienização de verduras, 31,3% costumam fazer a higienização apenas com água
corrente e 18,8% com água corrente e vinagre. Para higienização de frutas,
35,7% utilizam apenas água corrente e 22,7% água corrente e detergente.
Para a higienização segura de
verduras, legumes e frutas que serão consumidos crus, a recomendação é lavar
com água corrente e utilizar uma solução clorada com um tempo de contato mínimo
de 10 minutos, seguido de novo enxágue em água corrente.
O percentual de pessoas que usam
água com solução clorada, segundo o estudo, é de 37,7% (para verduras) e 28,5%
(para frutas). Já os vegetais que serão cozidos ou as frutas que serão
consumidas sem a casca não precisam passar pela desinfecção em solução clorada.
Armazenamento
A pesquisa mostra que parcela
significativa dos entrevistados realiza práticas inadequadas de higiene,
manuseio e armazenamento de alimentos. Para corrigir esses erros, os
pesquisadores elaboraram um material educativo para orientar sobre a forma
correta de armazenar os alimentos na geladeira.
Ao fazer compras em
supermercados, a maioria dos ouvidos na pesquisa, 81%, não utiliza sacolas
térmicas para transportar alimentos refrigerados ou congelados até suas
residências.
A nutricionista Jessica Finger
lembra que em um país como o Brasil, onde as temperaturas chegam facilmente a
30°C em várias cidades durante o ano todo, é fundamental que os produtos
perecíveis sejam transportados em condições adequadas, dentro de uma sacola
térmica. Jessica também conduziu a pesquisa, que teve ainda o envolvimento do
estudante de iniciação científica Guilherme Silva, graduando de Nutrição na
USP.
Com relação às sobras de
alimentos, 11,2% dos participantes da pesquisa relataram armazená-las na
geladeira passada mais de duas horas do preparo, o que representa risco à
segurança dos alimentos. “Não é recomendado deixar alimentos prontos por mais
de duas horas sem refrigeração, visto que a temperatura ambiente favorece o
crescimento microbiano nesses alimentos. Essa é uma das principais práticas
responsáveis por surtos de doenças de origem alimentar,” alertam os
pesquisadores.
A pesquisa ainda evidenciou que é
comum descongelar os alimentos em temperatura ambiente (39,5%) ou dentro de um
recipiente com água (16,9%), o que também não é adequado, visto que os
alimentos devem ser mantidos a uma temperatura segura durante o
descongelamento, podendo ser realizado na geladeira ou no micro-ondas.
Geladeira
Sobre o armazenamento de carnes
na geladeira, a maioria dos participantes (57,2%) relatou armazenar as carnes
na própria embalagem que contém o produto. A prática é questionável, uma vez
que é preciso utilizar um recipiente adequado para evitar o gotejamento do suco
da carne e a contaminação de outros alimentos estocados no refrigerador.
A boa notícia da pesquisa é que
em relação à temperatura dos refrigeradores, dos 1.944 registros coletados, 91%
ficaram entre a faixa de temperatura recomendada, de 0ºC a 10°C. Segundo os
pesquisadores, esse dado é importante, pois pode ser utilizado em estudos de
modelagem para prever a multiplicação de micro-organismos nos alimentos
refrigerados.
Por Agência Brasil -
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