Prefeitos confirmam pedidos de propina em troca de verbas do MEC.
Pastores acusados de fazerem as
abordagens serão ouvidos no Senado
Em audiência pública na Comissão
de Educação do Senado, nesta terça-feira (5), prefeitos de três municípios
confirmaram aos senadores que foram abordados por pastores que pediam o
pagamento de propina em troca da liberação de verbas do Ministério da Educação
(MEC). A intermediação, segundo eles, teria sido feita pelos pastores Arilton
Moura e Gilmar Santos, ligados à Igreja Ministério Cristo para Todos, de
Goiânia (GO).
Segundo o relato do prefeito de
Luís Domingues (MA), Gilberto Braga (PSDB), ele foi procurado em abril do ano
passado, quando estava em Brasília para participar de um evento no MEC com a
presença do então ministro da pasta Milton Ribeiro e de diversos prefeitos. Um
grupo de 20 a 30 pessoas foi almoçar, sem a presença do ministro, no
restaurante Tia Zélia. Nesse local, Braga disse que foi questionado pelo pastor
Arilton Moura sobre quais seriam as demandas do município.
O pastor teria orientado o
prefeito de Luis Domingues a pagar R$ 15 mil “para protocolar o pedido no MEC”.
Além disso, após a liberação dos recursos, Arilton Moura teria dito que o
prefeito deveria lhe dar “1 quilo de ouro”.
"Ele disse que tinha que ver
a nossa demanda. De R$ 10 milhões ou mais, tinha que dar R$ 15 mil para ele
protocolar [no MEC]. E, na hora que o dinheiro já estivesse empenhado, era para
dar um tanto X. Para mim, como a minha região era área de mineração, ele pediu
um quilo de ouro", contou.
Diante do pedido, o prefeito
acrescentou que não disse “nem que sim, nem que não" e foi almoçar.
Segundo Braga, o pagamento não foi feito nem as demandas liberadas.
Outro prefeito, Kelton Pinheiro
(Cidadania), de Bonfinópolis (GO), também deu detalhes aos senadores de uma
situação semelhante. À Comissão, ele disse que os pastores Arilton Moura e
Gilmar Santos teriam cobrado propina de R$ 15 mil para viabilizar a construção
de uma escola com 12 salas, orçada em R$ 7 milhões, no município. A abordagem
também ocorreu em um almoço com prefeitos que estavam em Brasília.
“O pastor Arilton chegou na minha
mesa e me abordou de uma forma muito abrupta e direta: ‘Olha prefeito, vi que
no seu ofício o senhor pede a escola de 12 salas. Essa escola deve custar uns
R$ 7 milhões. Mas é o seguinte, eu preciso de R$ 15 mil na minha mão hoje, você
faz a transferência para a minha conta. Para depois não cola comigo, porque
vocês políticos. São um bando de malandros, que não tem palavra’. Aquilo me deu
ânsia de vômito”, disse o prefeito Kelton Pinheiro aos parlamentares.
O prefeito de Boa Esperança do
Sul (SP), José Manoel de Souza (PP), foi mais um a denunciar a cobrança de
propina dos pastores. No caso dele, o valor pedido – em março do ano passado –
foi ainda maior, cerca de R$ 40 mil. No encontro, estariam presentes o
ex-ministro, os dois pastores e o presidente do Fundo Nacional de
Desenvolvimento da Educação (FNDE), Marcelo Lopes da Ponte.
“O pastor Arilton me disse:
‘Prefeito, você sabe muito bem como funciona, né? Não dá pra ajudar todos os
municípios, mas eu consigo te ajudar com uma escola profissionalizante. Eu faço
um ofício agora, eu coloco no sistema e, em contrapartida, você deposita R$ 40
mil na conta da igreja evangélica'”, relata. “Eu então bati nas costas dele
[Arilton] e falei que para mim não serviria”, completou.
Livre acesso
Segundo as denúncias, mesmo sem
cargos formais, os pastores tinham livre trânsito no ministério e intermediavam
os pleitos de prefeituras junto a Ribeiro. O ministro deixou o comando da pasta
após a divulgação de áudios em que ele afirma dar “prioridade” no repasse de
verbas do FNDE aos “prefeitos que são amigos do pastor Gilmar Santos”. Ribeiro
diz que a prioridade atende a um pedido do presidente Jair Bolsonaro.
Na próxima quinta-feira (7) a
Comissão de Educação ouve os pastores Arilton Moura e Gilmar Santos. Enquanto
Milton Ribeiro ainda estava no cargo, o colegiado aprovou um convite para que
ele comparecesse ao Senado. A audiência seria na semana passada, mas diante da
exoneração de Ribeiro, ele não compareceu nem justificou sua ausência.
Histórico
As denúncias, que surgiram na
imprensa em março, levaram à queda de Milton Ribeiro, que também é pastor
protestante, no último dia 28. Em sua defesa, o ex-ministro afirmou que não
praticou atos ilícitos.
"Tenho plena convicção de
que jamais pratiquei qualquer ato de gestão que não fosse pautado pela
legalidade, pela probidade e pelo compromisso com o Erário. As suspeitas de que
foram cometidos atos irregulares devem ser investigadas com profundidade",
destacou.
Ele acrescentou que decidiu
solicitar ao presidente Bolsonaro a exoneração do cargo de ministro para que
não paire nenhuma incerteza sobre sua conduta e a do governo federal. “Meu
afastamento visa, mais do que tudo, deixar claro que quero uma investigação completa
isenta", disse em nota.
Investigação
Milton Ribeiro é alvo de
investigação por suposto favorecimento na liberação de recursos para
prefeituras por meio da intermediação de dois pastores. Os religiosos também
são alvo do inquérito que foi aberto pelo Supremo Tribunal Federal (STF), a
pedido da Procuradoria Geral da República (PGR).
Por Karine Melo - Repórter da Agência Brasil -
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