Bolsonaro soltou brado de "imbrochável" e virou a piada do bicentenário.
Jair Bolsonaro queria mostrar
força durante a festa do bicentenário da Independência do Brasil. Conseguiu, no
máximo, prestar tributos à sua própria ilusão de virilidade, como definiu certa
vez o ator Pedro Cardoso.
No dia em que o país celebrou os
200 anos do grito de D. Pedro 1º, o presidente tomou em mãos o microfone para
bradar em público que é “imbrochável”. Fez isso diante de uma multidão que
deixava claro, em mensagens e cartazes expostos desde a véspera, o que a levava
até ali. Uma das placas, por exemplo, pedia a destituição dos membros do STF,
do TSE e do Congresso.
Deve ser por isso que os chefes
dos Poderes evitaram posar ao lado do capitão durante os atos. A força de um
governante também pode ser medida pelas lacunas.
Na plateia, o desejo de
reinstalação dos poderes imperiais estava reeditado, agora com a camisa da
seleção.
Pelo menos durante a manhã,
Bolsonaro passou longe do figurino incendiário que levou ao ato do ano passado
na avenida Paulista, quando chamou Alexandre de Moraes de “canalha” e prometeu
dali em diante não cumprir qualquer ordem do Supremo.
Dessa vez, na capital, ele usou a
cerimônia de Estado para fazer “apenas” propaganda eleitoral. Para os padrões
atuais, saiu barato.
Em busca do voto das mulheres,
que nas pesquisas demonstram apoio majoritário ao adversário Luiz Inácio Lula
da Silva (PT), o presidente apresentou a companheira, Michele Bolsonaro, como
um troféu ao chamá-la de princesa e pediu para que os eleitores fizessem
“várias comparações” entre as opções em jogo. “Até entre as primeiras-damas”,
disse. “Podemos fazer comparações até entre as primeiras damas. A minha é uma
mulher de Deus, de família e ativa na minha vida.”
O subtexto era um ataque velado a
outra mulher, ou mulheres, no caso as companheiras de outros candidatos a
presidente.
Era isso mesmo: Bolsonaro queria
que o eleitor comparasse quem fazia melhor o papel de figura decorativa à
autoridade masculina –e “imbrochável”, frisou mais de uma vez.
Fez isso um dia após atacar outra
jornalista mulher ao ser questionado sobre uso de dinheiro vivo por seus
familiares para compra de 51 imóveis no valor de R$ 56 milhões. Bolsonaro desconversou
dizendo que o marido da entrevistada era seu eleitor.
No palanque em Brasília, diante
do ministro da Defesa, Paulo Sérgio Nogueira, e do convidado especial da festa,
o presidente de Portugal, Marcelo Rebelo de Sousa, Bolsonaro mostrou que em três
anos e meio não aprendeu ainda o que separa a figura pública dos seus fetiches
privados. Só o primeiro precisa prestar contas de atos e palavras.
A lambança mostrou também que
está engajado em transformar o país em uma grande república de bananas –tudo
com a ajuda de um coração monárquico imerso em formol.
Murilo Rubião e outros
representantes do realismo fantástico tupiniquim não imaginariam tamanha
distopia.
O presidente “imbrochável” pode
não ter conseguido um voto a mais, além do cercadinho, com seu brado calibrado
na desconfiança.
Se nada der certo, pode ao menos
mandar o currículo para a partir de 2023 reforçar o elenco como personagem de
si mesmo em “A Praça é Nossa”.
Ou como modelo de alguma
propaganda de medicamento revigorante.
Fale com seu médico, presidente.
Eu falaria.
Matheus Pichonelli/Yahoo Notícias
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