Bolsa Família completa 20 anos alcançando 21,45 milhões de famílias.
"Isso não é favor do governo, é obrigação", diz
Lula
“Um dia eu precisei do Bolsa Família e hoje não preciso
mais”, disse a psicóloga Raquel Lima Clemente, ex-beneficiária do programa
social. Em cerimônia de celebração dos 20 anos do Bolsa Família, nesta
sexta-feira (20), a moradora do Espírito Santo contou como a educação e a renda
garantida pelo programa mudou a vida da sua família.
“Sou psicóloga formada pela Universidade Federal do Espírito
Santo, mas nem sempre foi assim. Quando eu tinha 10, 12 anos eu precisei
trabalhar em casa de família para ajudar minha mãe, ajudar meus pais com verba
e eu não tive oportunidade de estudar”, disse, explicando que, “nos atropelos”,
chegou ao ensino médio, mas precisou parar os estudos. Em 2010, voltou para a
sala de aula e em 2018, concluiu o curso superior.
O Bolsa Família entrou na vida dela antes disso, quando tinha
três dos seus quatro filhos ainda pequenos, o marido desempregado e a família
em dificuldade financeira. “Eu pensei comigo: eu não posso cometer com eles a
injustiça que eu achei que foi cometida comigo. Eu não posso pegar eles e
colocar para trabalhar. Eu tenho que priorizar a educação”, relembra.
“Eu fui contemplada com Bolsa Família, então eu não precisei
pegar o tempo da tarde deles e colocar para trabalhar. Eles podiam no tempo da
tarde ser criança, porque criança precisa brincar na rua, subir em pé de árvore
e outras coisas. Eles podiam fazer os trabalhos. Estudar para as provas”,
disse, explicando que priorizava a compra de material escolar com o benefício.
“Eles não precisavam trabalhar para me ajudar porque eu tinha
o Bolsa Família. Eu plantei uma semente quando eu fiz isso porque hoje eu tenho
dois filhos engenheiros, todos formados pela Universidade Federal do Espírito
Santo”, destacou.
A cerimônia foi realizada no Ministério do Desenvolvimento e
Assistência Social, Família e Combate à Fome (MDS) e teve participação, por
videoconferência, do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que se recupera de
cirurgia na residência oficial, no Palácio da Alvorada.
O programa de transferência de renda foi criado em 20 de
outubro de 2003, no primeiro mandato do presidente Lula. Coordenado pelo
Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome
(MDS), o Bolsa Família busca integrar políticas públicas, facilitando o acesso
das famílias a direitos básicos como saúde, educação e assistência social.
Crianças vitimadas
Em seu discurso, Lula relembrou das personalidades que
ajudaram na criação do programa e atuaram nas discussões sobre a segurança
alimentar nos seus governos. Ele ainda reforçou a importância da distribuição
de renda para o desenvolvimento do país e melhoria da qualidade de vida das
pessoas.
Em nome das crianças brasileiras, o presidente prestou
solidariedade às crianças que estão morrendo em razão do conflito entre Israel
e o grupo extremista palestino Hamas, no Oriente Médio. Mais de 1,5 mil
crianças já morreram na Faixa de Gaza, território controlado pelo Hamas e que
sofre com o cerco promovido por Israel.
“Não é possível tanta irracionalidade, tanta insanidade, que
as pessoas façam uma guerra tendo em conta de que as pessoas que estão morrendo
são mulheres, são pessoas idosas, são crianças que não estão tendo sequer o
direito de viver”, disse, reafirmando seu apelo por paz, em defesa de crianças
palestinas e israelenses.
“Hoje, quando o programa Bolsa Família completa 20 anos, eu
fico lembrando que 1,5 mil já morreram na Faixa de Gaza, que não pediram para o
Hamas fazer o ato de loucura que fez, de terrorismo, atacando Israel, mas
também não pediram para que Israel reagisse de forma insana e matasse eles.
Exatamente aqueles que não têm nada a ver com a guerra, aqueles que só querem
viver, aqueles que querem brincar, aqueles que não tiveram direito de ser criança”,
destacou.
Superação da fome
O primeiro pagamento do Bolsa Família foi realizado em
outubro de 2003 e contemplou 1,15 milhão de famílias. Cada família recebeu, em
média, R$ 73,67.
A superação da pobreza e a transformação social foram os
alicerces de criação do Bolsa Família, que unificou o pagamento de diversos
benefícios em um só programa. Dados do Instituto Mobilidade e Desenvolvimento
Social, citados pelo MDS, apontam quem mais de 64% das crianças e dos
adolescentes que recebiam o Bolsa Família em 2005 deixaram o Cadastro Único até
2019, com a inserção desse público no mercado formal de trabalho.
Lula reafirmou o compromisso de tirar, novamente, o Brasil do
Mapa da Fome das Nações Unidas. O país havia saído dessa estatística em 2014,
por meio de estratégias de segurança alimentar e nutricional executadas ao
longo da década anterior, mas voltou a figurar no cenário nos anos seguintes,
especialmente no período da pandemia de covid-19.
Dados do relatório global Estado da Segurança Alimentar e
Nutrição no Mundo, divulgado por cinco agências especializadas da ONU, apontam
que um em cada dez brasileiros (9,9%) passava por situação de insegurança
alimentar severa entre 2020 e 2022. Além disso, segundo o mesmo estudo, quase
um terço (32,8%) da população do país está incluído nas categorias de
insegurança alimentar severa ou moderada, o que equivale a 70,3 milhões de
brasileiros. A situação mostra um agravamento no acesso à segurança alimentar
no país. Os dados anteriores, de 2014 a 2016, indicavam percentual de 18,3%.
“E é importante que a sociedade brasileira saiba que isso não
é favor de governo, isso é obrigação. A coisa mais barata que tem no Orçamento
da União é cuidar do povo pobre, é cuidar das nossas crianças”, disse. “A gente
não tem que falar em gasto quando se trata de combater a fome, de melhorar a
educação, a saúde, quando se trata de investir no trabalho daqueles que cuidam
desse país, que cuida do nosso povo e que cuida das nossas crianças”,
acrescentou Lula.
Pesquisa conduzida pelo Banco Mundial também mostra efeitos
positivos do programa Bolsa Família nas atividades econômicas locais, com
aumento no consumo, nos empregos, no número de contas bancárias e na
arrecadação de impostos nos lugares onde o programa se expandiu de forma mais
consolidada.
Outro estudo, realizado pela Fundação Getúlio Vargas (FGV),
Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e Banco Mundial, em parceria
com o MDS, aponta que 3 milhões de famílias beneficiárias do programa deixaram
a pobreza neste ano. A linha de pobreza considerada no estudo é o valor de R$
218 mensais per capita.
Não há ninguém no Bolsa Família em condição de pobreza
extrema, ou seja, com renda per capita de R$ 109, já que o valor mínimo é de R$
142 por pessoa na família, sendo o mínimo de R$ 600 por família.
As mulheres são as principais responsáveis familiares no
Bolsa Família. Em outubro, somam 17,79 milhões, o que equivale a 82,9% do
total. Dados do MDS mostram ainda que a maioria das famílias são monoparentais
femininas com filhos (independentemente da idade dos filhos), que somam em
outubro 10,76 milhões (50,16%). Outra predominância diz respeito aos pretos ou
pardos, que respondem por 73% do total de beneficiários.
Benefícios concedidos
Neste mês, 21,45 milhões de famílias de todos os 5.570
municípios brasileiros estão recebendo o Bolsa Família. O cronograma de
repasses é escalonado e tem por base o final do número de identificação social
(NIS) de cada integrante. Os pagamentos começaram no dia 18 e seguem até o dia
31. O valor médio do benefício pago é de R$ 688,97 em outubro.
Um dos objetivos do novo Bolsa Família é ampliar a proteção a
crianças e adolescentes e ser capaz de dar uma atenção proporcional às
diferentes composições familiares. No mês em que completa 20 anos, o MDS
reforçou o programa e implementou o adicional para mães de bebês de até seis
meses de idade. Chamado de Benefício Variável Familiar Nutriz, o adicional
corresponde a seis parcelas de R$ 50 para garantir a alimentação da criança.
Com isso, o governo fechou ciclo de modernizações do Bolsa Família,
relançado em março deste ano. Durante o governo Jair Bolsonaro, o programa de
transferência de renda foi chamado de Auxílio Brasil. Além do novo adicional, o
programa paga um acréscimo de R$ 50 a famílias com gestantes e filhos de 7 a 18
anos e outro, de R$ 150, a famílias com crianças de até 6 anos.
O novo Bolsa Família possui ainda uma regra de proteção para
aqueles que conseguem emprego. Pelas regras, é permitida a permanência de
beneficiários no programa para famílias que elevam a renda até o patamar de
meio salário mínimo por integrante do núcleo familiar. Nesse caso, elas recebem
50% do valor total do benefício. Em outubro, a regra de proteção alcança 1,97
milhão de famílias.
Contrapartidas
O novo Bolsa Família também retomou os parâmetros desenhados
no primeiro governo do presidente Lula, quando foi criado, em 2003. O principal
deles é a exigência de contrapartidas das famílias beneficiadas, como a
obrigação do acompanhamento pré-natal para gestantes e do estado nutricional
das crianças menores de sete anos.
Ainda é exigido a atualização da caderneta de vacinação com
todos os imunizantes previstos no Programa Nacional de Vacinação, do Ministério
da Saúde. As famílias também devem garantir a manutenção da frequência escolar
das crianças e adolescentes, de 60% para crianças de 4 a 5 anos e de 75% para
beneficiários de 6 a 18 anos que não tenham concluído a educação básica.
Agência Brasil
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