PALAVRA DO SENHOR – Os sinais de Deus
A LITURGIA DESTE DOMINGO CELEBRA A MANIFESTAÇÃO DE JESUS A
TODOS OS HOMENS. Não é uma realidade privada. O Menino encontrado no presépio é
“luz” que se acende na noite do mundo. A “luz de Deus” brilhou na história e no
mundo, iluminou os caminhos para que o ser humano encontre vida e salvação.
Os capítulos 56-66 do livro do profeta Isaías trazem um
conjunto de profecias que para alguns estudiosos estes textos são atribuídos a
um profeta anônimo que exerceu seu ministério em Jerusalém no pós-exílio da
Babilônia.
Jerusalém está mergulhada na obscuridade. Mas, de repente,
soa o grito anunciando a aurora de um novo tempo. O sol aparece atrás das
montanhas. É a cidade em reconstrução transfigurada pela luz de um novo dia.
Como é bela esta imagem de Deus como uma luz que se acende na
vida do povo para aquecer o coração dos que caminham se esperança, abatidos e
cansados. Há momentos na historia humana, como em Jerusalém, que a guerra se
impõe sobre os esforços pela paz, o egoísmo se sobrepõe sobre a comunhão, o
poder sobre os pequenos, a arrogância sobre a humildade, o ódio sobre o amor, o
dinheiro sobre a dignidade humana. Nesses contextos é muito difícil encontrar
luz no coração do ser humano e vida plena para todos. E quem se coloca como
instrumento de fraternidade quase sempre é anulado por todos os tipos de
críticas odiosas, cancelamentos e morte.
O medo é um afeto natural que, diante dos sinais de trevas, o
ser humano tende a por seus olhos nos chão como se não soubesse contemplar
novos horizontes. Os maus sabem como manipular o medo das pessoas e fazer-lhes
– de modo perverso – desistir de seus sonhos, de seu caminho e de sua própria
vida. Às vezes, o ambiente não ajuda para que as pessoas resinifiquem o seu
caminho, mas ao contrário, são devoradores de sonhos; ou mesmo, as pessoas ao
seu redor são como “dementadores” (criaturas da escuridão do filme Harry Potter
que se alimentam da felicidade humana e consumem a alma das pessoas). É nessas
horas da história que é fundamental esperançar: levantar os olhos e perceber a
luz de Deus.
A CARTA AOS EFÉSIOS é aquilo que o autor chama “o mistério”:
trata-se do projeto salvador de Deus, definido e elaborado desde sempre, oculto
durante séculos, mas revelado e concretizado plenamente em Jesus, comunicado
aos apóstolos e, nos “últimos tempos”, tornado presente no mundo pela Igreja.
O apóstolo Paulo se fez o grande arauto da “boa nova” de
Jesus. Todos partilham o mesmo projeto salvífico, em igualdade de
circunstâncias como “filhos de Deus”; e todos participam da promessa feita por
Deus a Abraão (cf. Gn 12,3), promessa cuja realização Cristo levou a cabo.
Incluir e não excluir faz parte do Mistério Revelado em Jesus
Cristo. A fraternidade anunciada por Jesus implica o amor sem limites, a
partilha, a solidariedade à inclusão. Quem é de Jesus compreendeu este Mistério
de Amor.
A Mãe Igreja deve ser expressão viva desse Projeto Divino que
derruba todo e qualquer muro ideológico de separação. Sua comunidade eclesial é
assim? Sua casa é assim?
O EVANGELHO DE HOJE (MT 2, 1-12) o autor coloca em evidência
alguns elementos que merecem um olhar específico e um aprofundamento para
compreendermos melhor um pouco o Mistério que hoje celebramos.
“Chegaram a Jerusalém uns Magos vindos do Oriente” (v
1). Na catequese de Mateus, esses povos
estrangeiros de que falava a primeira leitura (cf. Is 60,1-6), que se põem a
caminho de Jerusalém para encontrar a luz salvadora de Deus que brilha sobre a
cidade santa. Todo tem sede de Deus, se põem no caminho e se tornam peregrinos
da esperança;
“Onde Ele está” (v.2). Do ponto de vista da fé a esperança
está ligada a participação na vida divina e desejar Deus: “a minha alma tem
sede de Deus” (Salmo 42,2ss). Quem deseja Deus não se torna uma pessoa passiva,
mas está à busca do Senhor, como os Magos. Ainda que não tenham chegado à fé
plena. A esperança de encontrar-se com o Rei é o que os move.
“Vimos a sua estrela/luz” (Mt 2, 2). Para construir uma narrativa bem
significativa tenha se inspirado num texto do livro dos Números onde um profeta
chamado Balaão, “o homem de olhar penetrante” (Nm 24,15), anuncia “uma estrela
que sai de Jacob e um cetro flamejante que surge do seio de Israel” (Nm 24,27).
Esse anúncio teve sempre, para os teólogos de Israel, um claro sabor
messiânico.
Há uma perspectiva no mundo judaico de que a manifestação da
luz de Deus (o Messias) viria de Jerusalém. Por causa do templo, mas não é de
lá que sai o salvador. A narrativa do evangelho diz que em Jerusalém a estrela
não brilhava mais.
Os antigos diziam que Jerusalém iria atrair as nações, mas as
nações quando chegam a Jerusalém (representada pelos magos) ali não encontraram
luz. Quem será encontrado ali? Herodes que ficou perturbado com a notícia do
menino, o povo que não se alegra, mas se perturba.
Os magos não tinham as Escrituras (textos sagrados), mas
procuram a Deus lendo o livro da vida. Santo Agostinho, em um de seus famosos
sermões dizia que Deus nos deu dois livros o da vida (o do cosmo) e o da
escritura. No cosmo está a Semente do Verbo, a Palavra de Deus: ‘Faça-se’ (cf.
Gm 1, 1-19), mas o pecado não nos permitiu enxergar bem o livro da vida. Então,
nos deu o livro escrito para que por meio dele pudéssemos ler e reconhecer no
dia-a-dia da nossa história.
Deus pode ser encontrado pela leitura da vida, do cosmo e da
natureza. Cada pessoa ou criatura é uma palavra de Deus. E quando não
conseguimos ler a vida, temos a ajuda da Escritura que nos faz ler a vida. A
vida ilumina a Escritura e a Escritura Ilumina a vida. É o diálogo da vida
entre Verbo e a criação.
A luz de Deus se manifestou Quem é esta estrela? Jesus, luz
do mundo. No livro do Apocalipse (2, 28. 22,16) Jesus vai ser chamado de
estrela da manhã que ilumina todo o ser humano e todas as nações. A luz é
sempre associada a presença de Deus na história: “O Senhor é minha luz, Ele é
minha salvação” (salmo 27).
“Em Belém” (v. 5). A Sagrada Escritura aponta Belém como
lugar do nascimento do “chefe/pastor” que apascentará o povo (cf. Mq 5,1. 2Sm
5, 2. 1Cr 11, 2). Os Doutores da Lei que estavam em Jerusalém eram conhecedores
desta profecia, mas não sabiam ler os fatos da história. Enrijecidos, não
saíram do lugar. Quem peregrina? Os magos. Não basta ler a Bíblia e não fazer a
leitura da vida. Não basta ter conhecimento das escrituras e não se colocar a
caminho de Belém (casa do Pão/fraternidade).
Do Palácio a Casa. Nas promessas dos antigos se colocavam o
templo como lugar do encontro com Deus. Aqui, nem no templo, nem no palácio,
mas na casa. Belém/casa do pão é lugar da acolhida de todos, inclusive do Filho
de Deus.
A Igreja tem sido lugar de acolhida? Ou ainda estamos sob o
véu de uma “Teologia puritana” que segrega e exclui? Nós somos “casas abertas”?
Sabemos fazer uma leitura da vida e da bíblia?
Feliz Ano Novo! Caminhemos como peregrinos da esperança no
desejo de encontrar a Deus.
Edjamir Silva Souza
Padre e Psicólogo
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