Pacientes que ficaram cegos após mutirão de catarata foram informados por médicos que quadro pode ser irreversível.
Doze idosos perderam ou ficaram com a visão parcialmente
comprometida após procedimento oftalmológico pelo AME de Taquaritinga, SP, em
outubro de 2024. Idosa conta que quase perdeu o globo ocular e passou por
transplante de córnea.
Pacientes que perderam a visão após um mutirão de catarata no
Ambulatório de Especialidades Médicas (AME) de Taquaritinga (SP) foram
informados por médicos que a situação pode ser irreversível. Os procedimentos
foram realizados em outubro de 2024, mas até agora as causas do problema não
foram esclarecidas.
O pintor Carlos Augusto Rinaldi, de 66 anos, conta que, após
três meses de espera, parte dos pacientes foi encaminhada para um hospital em
Araraquara (SP) e outra parte para o Hospital das Clínicas de Ribeirão Preto,
onde especialistas confirmaram para alguns deles que não há possibilidade de
recuperação.
"Já vai dar quatro meses. Então, tanto [no hospital em]
Ribeirão, que tem outros casos [em acompanhamento], foi constatado que era
irreversível e em Araraquara também. Inclusive, vou ter uma consulta na
segunda-feira e vou ver a avaliação. Estão tentando tirar a córnea porque a
retina não tem mais jeito, para ficar uma qualidade de vida melhor em um olho,
tirar esse branco. Agora estamos esperando apoio", conta.
A salgadeira Maria de Fátima Garcia Chiari, que mora em Matão
(SP), disse que já saiu da cirurgia com dor, recebeu analgésico, mas começou a
passar mal logo quando chegou em casa. Ela retornou ao hospital com a filha,
onde recebeu mais remédios para dor.
Quando retornou ao pós-operatório, já no AME, foi informada
pela médica de que em 15 dias estaria curada, mas não foi o que aconteceu.
"Com o passar dos dias, eu comecei a ver uns vultos e
ficou nisso. Até o dia que eu perdi a visão total. Do dia 21 de outubro [data
da cirurgia] e no dia 31 de dezembro, eu comecei a perder a visão. No dia 1,
ficou tudo cinza e, quando foi no dia 2 [de janeiro], estava tudo preto",
afirma.
Ela foi atendida por uma retinóloga que também informou que
não havia mais o que ser feito para reverter a situação. Maria de Fátima quase
perdeu o globo ocular, mas foi salva por um transplante de córnea que realizou
em Araraquara. "A córnea já estava derretida igual a um papel
molhado", afirma.
Pacientes reclamam de falta de assistência
Carlos reclama da falta de apoio e acompanhamento tanto do
AME quanto da Santa Casa de Franca, responsável pela gestão do ambulatório.
"Ficou o dito pelo não dito", afirma.
O pintor também afirma que não ligaram para prestar
assistência e as medidas tomadas, como fornecimento de colírios e a entrada na
fila do transplante de córnea, só foram realizadas por insistência dos próprios
pacientes.
De acordo com Maria de Fátima, os pacientes afetados ficaram
sem o medicamento até dezembro e precisaram comprar colírios de alto custo por
conta própria.
A mulher também afirma que ficou chocada ao descobrir que
outras pessoas estavam passando pelo problema, já que estava sendo tratada como
um caso isolado pelos médicos. Ela também acredita em descaso por parte das
autoridades.
"Quando viram que a primeira pessoa reclamou que estava
doendo, tinha que ter parado todas as cirurgias. Foram feitas 24 cirurgias e 12
pessoas foram lesadas. Agora, só não entendo o porquê não pararam".
Com a perda da visão, Carlos e Maria de Fátima não conseguem
mais trabalhar e tiveram a renda mensal comprometida.
O que dizem as autoridades
Em nota, a Secretaria de Saúde de Taquaritinga informou que
os pacientes tiveram complicações pós-cirúrgicas oftalmológicas. Em uma visita
técnica, membros das vigilâncias sanitárias estadual e municipal identificaram
inadequações na Sala de Materiais para Esterilização (SME) do AME. A área está
interditada. A prefeitura do município informou que todos foram colocados na
fila de transplante de córnea.
A secretária executiva da Saúde do Estado de São Paulo,
Priscilla Perdicaris, classificou o caso como "fato isolado
gravíssimo" e disse que uma investigação apura as causas para a adoção de
providências. Segundo Priscilla, toda a equipe médica envolvida no mutirão foi
afastada das funções.
“O fato está sendo apurado. Tão logo nós soubemos pela OS que
gerencia essa unidade, nós enviamos a nossa equipe de Vigilância Sanitária e
enviamos a equipe da Controladoria de Gestão de Serviços em Saúde, que faz a
coordenação dos AMEs no estado, para um levantamento detalhado de tudo o que
pode ter acontecido na cirurgia.”
Ainda à espera dos laudos para avaliar as medidas necessárias
e sem dar detalhes, Priscilla Perdicaris disse que a sala onde é feita a
esterilização dos equipamentos passou por adequações. Todas as cirurgias feitas
no AME de Taquaritinga estão suspensas.
A secretária disse que os pacientes estão recebendo
medicação, atendimento médico e multidisciplinar para que possam restabelecer a
qualidade de vida.
Por Fernanda Marion, Daniel Olinto, EPTV; g1 Ribeirão Preto e Franca
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