PALAVRA DO SENHOR – “Conheço as suas angústias. Desci para libertá-los”.
O CAMINHO PASCAL É O CAMINHO
DA LIBERTAÇÃO. As pessoas de nosso tempo falam muito de liberdade, mas,
recentemente, com um foco muito maior numa economia liberal (neoliberalismo) e
não na boa liberdade humana.
Dar o tom da liberdade
somente na economia sempre resultou na alienação da dignidade humana: a
sujeição de trabalhos forçados, a sobrecarga de tempo do trabalho (vive mais na
empresa do que em casa, não tem tempo para a família e os amigos), a
massificação de pessoas sem o respeito à subjetividade e a historia pessoal de
cada um: É o projeto de dominação sobre o outro.
Suprimi-se a idéia de “todos
somos irmãos” para sermos “senhores dos escravos”. Não é por acaso que as
religiões que tem fetiche por poder e dinheiro gostam muito dessa expressão:
“está amarrado em nome do Jesus”. NÃO ESTÁ MESMO. Sempre que Deus quis libertar
as pessoas Ele enfrentou a resistência por parte daqueles que tem ódio de uma
TEOLOGIA DA LIBERDADE. Escutemos a Palavra....
NA 1ª LEITURA (ÊXODO 3,1-8A.
13-15), ouvimos o quanto os clãs semitas sofreram sob o duro poder egípcio que
fez piorar as condições de vida do povo hebreu: trabalhos forçados (cf. Ex
1,8-14), eliminação das crianças do sexo masculino (cf. Ex 1,15-22) e
degradação progressiva das condições de trabalho (cf. Ex 5,6-23). Tudo parecia
uma situação sem saída: “os filhos de Israel gemiam na servidão, e ergueram até
Deus o seu grito de socorro. Deus ouviu os seus gemidos e recordou-se da sua
aliança com Abraão, Isaac e Jacob. Deus viu os filhos de Israel e conheceu-os”
(Ex 2,23-25).
Os lamentos do povo, privado
de vida e de liberdade, têm paralelo, com os muitos cenários ao longo dos
séculos, no sofrimento de tantos que todos os dias são vítimas de mecanismos de
exploração, de injustiça, de violência e de morte.
“Conheço suas angústias e
desci para libertar”. Moisés é este enviado de Deus que faz o povo entender que
o Senhor está próximo, ao mesmo tempo em que organiza o povo para a libertação.
Não há este “Deus acima de todos, mas próximo de todos”. Esse Deus acima de
todos tem sido uma projeção por parte de quem quer ver o mundo sobre a sua
ótica: ESTOU ACIMA DE TODOS/ DO DIREITO E DA JUSTIÇA.
No contexto da leitura de
hoje, a identidade e a ação de Deus são reveladas: “Eu sou” é mesma identidade
daquele que “sempre está no meio”. Recordemos que essa é a mesma identidade de
Jesus: “Estarei convosco todos os dias”.
O SALMO 102(103) canta a
proximidade de Deus ao dizer: “O Senhor faz justiça e defende o direito de
todos os oprimidos. Revelou a Moisés os seus caminhos e aos filhos de Israel os
seus prodígios”. É dessa maneira que Deus caminha conosco: para nos libertar.
NA 2ª LEITURA (1 CORÍNTIOS
10,1-6.10-12), Paulo pretende convencer
os cristãos de Corinto a se esforçarem para receber a salvação e oferece-lhe o
exemplo do povo de Deus no Egito, em marcha pelo deserto, a caminho da terra
prometida. Os hebreus foram todos guiados para a liberdade.
Eles têm que, todos os dias,
se esforçarem para seguir Jesus e levarem uma vida coerente com evangelho. Por
isso, aos cristãos de Corinto que se consideravam “fortes”, Paulo avisa: “quem
julga estar de pé tome cuidado para não cair”. A auto-referencialidade,
autossuficiência, o orgulho, a convicção de que já se assegurou a salvação,
fazem com que facilmente nos percamos no caminho que conduz à vida eterna.
NO EVANGELHO (LUCAS 13,1-9),
continuamos a caminhar com Jesus. O “caminho” para Jerusalém não é apenas um
caminho geográfico, mas um caminho espiritual. É uma viagem longa, feita sem
pressas, durante a qual Jesus vai instruindo os discípulos, preparando-os para
serem testemunhas do Reino de Deus.
No cap. 12, 57 Jesus diz:
“Porque não julgais vós mesmos o que é justo?”. É um trechinho bem antes do evangelho
de hoje. Jesus tenta emancipar o povo da influência dos escribas e fariseus.
Eles tentam determinar aquilo que as pessoas devem ou não acreditar e praticar.
Mas a incoerência e a
auto-referencialidade destes fizeram com que Jesus ensinasse aos seus ouvintes
a ser pessoas maduras o suficiente e pensassem diferentes. Eles gostam de
subverter as pessoas a uma infantilidade religiosa e a um misticismo
catastrófico.
Em Lucas 13, 1. há uma
notícia assustadora e trágica que o povo traz para que Jesus: “a respeito de
alguns Galileus que Pilatos tinha matado, misturando seu sangue com o dos
sacrifícios que ofereciam”. Vejam, algumas pessoas estavam rezando e as tropas
de Pilatos chegaram e mataram esses Galileus (revolucionários contra o império)
e naquele momento o sangue deles se misturou com os dos sacrifícios (as vitimas
de expiação dos pecados). Aquela notícia
foi interpretada como uma punição pelos pecados.
Jesus também é um Galileu,
também tem fama de “agitador do povo”. Parece que aquele fato seria um recado
também para Ele. Mas, o Jesus não se intimida com a notícia e vai além da
interpretação: “Vós pensais que esses galileus são mais pecadores? Eu vos digo
que não”. (Lc 13,3a) E, continuando, dá o tom de sua interpretação: “Mas se não
vos converterdes morrereis todos do mesmo modo” (Lc 13, 3b).
Esse fato ocorrido com os
Galileus como também outros fatos ocorridos em Jerusalém, trazidos por Jesus
(cf. Lc 13, 4) Ele os interpreta longe da ideia de que há castigo por parte de
Deus para punir, dolorosamente, a ninguém de seus pecados. Deus não quer o mal
de ninguém, mas quer apenas que a gente se converta. Conversão ao evangelho
significa colocar o bem do outro como princípio ético de sua existência: “se
não fizermos o bem, teremos um final ruim”. E, fazer o bem, há um risco.
Joao Batista dizia que “toda
árvore que der bom fruto será cortada e lançada ao fogo” (Lc 3, 9). Ao contar a
parábola (Lc 13, 6-9. Mt 3,1-17) Jesus amplia o discurso, mas melhora a
interpretação que tinha sido dada por João e diz que “a figueira e a videira”
que representa o povo de Israel não seria cortada, mas adubada, cuidada na
esperança de que chegue a dar frutos.
Jesus muda aquela
interpretação do VIGIAR, PUNIR, DESTRUIR. Quem vive a vigiar a vida dos irmãos
para viver freneticamente falando mal dele, tentando destruí-lo a todo custo e
até mesmo usando o nome de Deus, converta-se. Jesus veio para vivificar. A ação
de Jesus diante dos pecadores e estéreis não é de punir e matar, mas
vivificante. Sobre isso, já falamos semanas atrás.
Deus oferece novas
possibilidades de dar frutos e vida. E ele mesmo colabora. O Deus apresentado
por Jesus, no evangelho de Lucas, é o Deus que torna o impossível possível.
Quem somente ver a relação de pecado e castigo, Jesus encontra ali a
oportunidade de redenção.
“O Filho do homem veio
procurar e salvar aquele que estava perdido” (Lc 19, 9-10). Jesus deixou claro,
desde Nazaré da Galileia, a sua terra, que Ele foi enviado pelo Espíritos de
Deus, a fim de anunciar a boa notícia aos pobres, a libertação aos mais fracos
e oprimidos de todo o tipo de precariedade e escravidão. Portanto, Ele abre
caminhos para fazer deste mundo um lugar mais humano para todos. Mas, a maioria
daqueles que o escuta tem dificuldades sérias para compreender ou não querem
abrir-se para que este mundo tenha uma transformação.
É menos trabalhoso crer num
Deus que pune os pecadores, que recompensa pessoas boazinhas e passa o tempo no
inteiro vigiando os outros como alguém controlador: “DEUS ESTÁ NO CONTROLE DE
TUDO” (Ditado popular). Por isso, sempre há um ou uns que são tidos como
culpados de tudo de ruim que acontece neste mundo (bode expiatório). Nós nunca
somos responsáveis, sempre os outros é que são errados. Fazemos marqueting de
nós mesmos nos colocando como pessoas de bem, sem nos dar conta de nossos
pecados.
Jesus deixa muito claro que
Deus não pode mudar o mundo sem que a gente não colabore: conversão e mudança
de atitude. Sem isso a árvore do evangelho não dar frutos, ela permanece
estéreo e sem vida. Jesus espera que cada um de nós dê os frutos que o reino
precisa: compreensão e misericórdia, de justiça equitativa, de desapego, de
paz, acolhimento, amor mútuo, etc... SEM ISSO, CONSTRUIMOS TEMPLOS,
SOFISTICAMOS O CULTO, MAS ALI NÃO HÁ O EVANGELHO.
Pe. Edjamir Silva Souza
Padre e Psicólogo
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