INSS identificou descontos irregulares em setembro de 2024. Instituto ainda não sabe quantas pessoas foram prejudicadas.
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Imagem ilustrativa - Reprodução internet |
Ao menos 8 meses antes da
Polícia Federal (PF) e Controladoria-Geral da União (CGU) fazerem uma operação
conjunta para aprofundar as investigações de um esquema de descontos não
autorizados em benefícios pagos pelo Instituto Nacional do Seguro Social
(Inss), a Auditoria-Geral da autarquia já tinha identificado inconsistências e
irregularidades em parte dos acordos assinados com organizações da sociedade
civil.
O Acordo de Cooperação
Técnica (ACT) é o instrumento legal com que o INSS autoriza o desconto das
mensalidades associativas diretamente dos benefícios previdenciários e o
repasse integral dos valores a associações, confederações ou entidades
representativas de aposentados e pensionistas que concordem com a cobrança.
“Exames permitiram
identificar que os procedimentos de formalização e operacionalização dos ACTs
firmados pelo INSS para permitir o desconto de mensalidade associativa em benefícios
previdenciários não atenderam integralmente os requisitos”, afirma o relatório
de uma inspeção que a Auditoria-Geral fez na Diretoria de Benefícios e
Relacionamentos com o Cidadão.
A auditoria foi feita a
pedido do então presidente da autarquia, Alessandro Stefanutto, no início de
maio de 2024, ou seja, quase 1 ano antes da PF e da CGU fazerem a operação que
levou o governo federal a suspender todos os ACT e, consequentemente, os
descontos automáticos, mesmo que autorizados pelos aposentados e pensionistas.
A Diretoria de Benefícios e
Relacionamento com o Cidadão é uma das áreas do INSS alvo da Operação Sem
Desconto. Diante das suspeitas, Stefanutto e o então responsável pela
diretoria, Vanderlei Barbosa dos Santos, que estava no cargo desde julho do ano
passado, além de outros três dirigentes da autarquia, foram afastados de suas
funções. Stefanutto foi exonerado do cargo.
Cancelamentos
O INSS ainda não sabe
quantos aposentados e pensionistas foram prejudicados, nem o montante cobrado
irregularmente. Mas só entre janeiro de 2023 e maio de 2024, o instituto
recebeu mais de 1,163 milhão de pedidos de cancelamento de cobranças. A
maioria, com a justificativa de que não tinham sido autorizados pelos
beneficiários ou por seus representantes legais.
“Do total de 1.163.455
tarefas [pedidos] de exclusão de descontos, 73.848 referem-se a descontos
autorizados; 33.317 sem informação no tocante à autorização e 1.056.290, o que
corresponde a aproximadamente 90,78% [do total], apresentaram indicação de não
autorização dos descontos associativos”, aponta o relatório, destacando que a
maioria dos beneficiários alegava desconhecer as entidades para as quais os
valores estavam sendo transferidos.
Do total de pedidos de
exclusão de descontos, a Auditoria-Geral selecionou, aleatoriamente, 603
requerimentos para checar se as entidades tinham cópia dos documentos que
comprovassem que os aposentados e pensionistas autorizaram o débito em folha.
“Em 329 dos 603 casos da
amostra, não houve apresentação dos documentos necessários à comprovação das
regularidades dos descontos. E dos 274 casos em que houve apresentação de
documentos, insta salientar que a aparente regularidade formal do processo não
implica, necessariamente, na comprovação da real intenção do segurado em
autorizar o desconto em seu benefício, conforme comprova a expressiva
quantidade de requerimentos com manifestação de repúdio para exclusão de
mensalidade apresentado ao INSS”, destaca o relatório.
Cooperação
O desconto das mensalidades
associativas em favor de entidades autorizadas pelo INSS é possível desde 1991,
quando entrou em vigor a Lei dos Benefícios da Previdência Social. Os valores
movimentados por meio do sistema de cooperação entre o INSS e as organizações
da sociedade civil cresceram ano após ano.
Em 2016, R$ 413 milhões
foram descontados dos benefícios previdenciários para pagamento de mensalidades
associativas. Em 2017, R$ 460 milhões. Em 2018, R$ 617 milhões. Em 2019, R$ 604
milhões. Em 2020, em meio à pandemia da covid-19, o valor caiu para R$ 510 milhões.
Em 2021, o total voltou a subir, atingindo R$ 536 milhões. Em 2022, foram R$
706 milhões. Em 2023, R$ 1,2 bilhão. E, no ano passado, R$ 2,8 bilhões.
Considerando os mais de
1,163 milhão de pedidos de cancelamento de cobranças que o instituto recebeu entre
janeiro de 2023 e maio de 2024, os auditores calcularam que, no período, o
desconto médio foi de cerca de R$ 39,74, cifra que, em alguns casos, pode ser
muito maior, já que os valores descontados variam conforme o percentual
estabelecido em cada um dos ACT.
“As irregularidades
apontadas pelos beneficiários em relação aos ACT indicam que a conveniência e o
interesse público na manutenção das parcerias não foram asseguradas sob a
perspectiva de custos e de impacto no atendimento ao cidadão pelo INSS”, aponta
o relatório, concluindo que os descontos não autorizados impactaram também a
fila do INSS, já que os pedidos para cancelamento das cobranças aumentaram o
volume de trabalho dos servidores do instituto.
O relatório, divulgado na
segunda-feira (28), faz nove recomendações, principalmente à Diretoria de
Benefícios e Relacionamentos com o Cidadão. Entre elas, a reavaliação do
processo de implantação dos descontos associativos; a verificação das
autorizações de cobranças e a análise da conveniência de não permitir novos
descontos até que todo o processo fosse revisto, o que não foi feito.
Nesta segunda-feira (28),
durante a reunião do Conselho Nacional da Previdência Social, o ministro da
Previdência Social, Carlos Lupi, informou que a pasta e o INSS iniciaram “a
verificação das denúncias em junho de 2023”. Segundo Lupi, em março de 2024,
antes mesmo da conclusão da auditoria na Diretoria de Benefícios, o ministério
e o INSS instituíram novas regras para o desconto das mensalidades
associativas, chegando a suspender novas operações.
“Em nenhum momento me omiti.
Muito pelo contrário, agimos para tentar conter as fraudes”, declarou Lupi.
Agência Brasil
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