Estratégia da oposição para incluir anistia ampla durante votação de projeto coloca governistas em alerta.
Relator deve apresentar parecer apenas com redução de penas,
mas aliados do ex-presidente Jair Bolsonaro defendem apresentação de destaque
em plenário para incluir perdão irrestrito.
Integrante da base aliada do governo na Câmara dos Deputados
acenderam o alerta para uma possível estratégia da oposição durante a votação
do projeto da anistia: apresentar uma sugestão de alteração no texto (chamado
na linguagem parlamentar de "destaque") durante a votação no plenário
e, com isso, aprovar a anistia ampla e irrestrita, incluindo o ex-presidente
Jair Bolsonaro.
Nas votações na Câmara, primeiro os deputados votam o parecer
apresentado pelo relator, chamado de texto-base. Na sequência, analisam cada
destaque apresentado pelos partidos – uma forma de alterar trechos específicos
do texto.
🔎Como se trata de um projeto de lei, qualquer alteração aprovada em
plenário precisa apenas do apoio de maioria simples da Casa – ou seja, metade
mais um entre os votantes. Neste caso, o quórum é ainda mais fácil do que a
aprovação da urgência da anistia, que precisava de maioria absoluta (257 votos
a favor).
"O relatório não vai ser o pior, eles [bolsonaristas]
vão apresentar destaque e, com maioria simples, incluir a anistia para
Bolsonaro. Abriu espaço para isso", disse um governista.
O relator da proposta, deputado Paulinho da Força
(Solidariedade-SP), já disse que o projeto irá focar na redução de penas
previstas em lei, e não em um perdão irrestrito. Por isso, ele sugere até um
novo apelido para a matéria: "projeto da dosimetria".
'Patifaria'
Parlamentares do Centrão também têm repetido que não há
nenhum clima para aprovar uma anistia ampla, que inclua Jair Bolsonaro.
Publicamente, aliados mais radicais do ex-presidente têm
manifestado incômodo com a mudança de rota da proposta.
"Que patifaria! Querem transformar o PL da anistia em PL
da dosimetria? Ainda falam que isso está de comum acordo com o Supremo para não
afrontá-lo. Isso só pode ser brincadeira", escreveu o deputado Carlos
Jordy (PL-RJ).
Mas, nos bastidores, parlamentares da oposição mais
pragmáticos defendem trabalhar em cima do texto pautado e se articulem para
incluir alterações no plenário.
"Ele [Paulinho da Força] vai fazer um texto brando, leve
e frouxo, mas vai ser pautado. E aí a gente muda no plenário como a gente
quiser", diz um deputado, que pretende levar a estratégia para a reunião
de parlamentares da oposição na próxima semana.
Segundo esse parlamentar, defender um projeto é "igual
fazer linguiça. Não importa o que entra, importa o que sai."
Reservadamente, este deputado admite que um projeto como a
oposição queria "jamais seria pautado" e que essa é a chance deles se
articularem na apresentação de destaques para anistia mais ampla.
Crimes antidemocráticos
Outro ponto de preocupação entre parlamentares alinhados ao
governo é a possibilidade de o projeto reduzir as penas para crimes contra a
democracia.
Hoje, o crime de golpe de estado tem punição de 4 a 12 anos
de prisão e o de abolição violenta contra o estado democrático de direito, de 4
a 8 anos.
Segundo uma minuta de texto que circula na Câmara, haveria a
possibilidade de as penas passarem, respectivamente, de 2 a 8 anos de prisão e
de 2 a 6 anos de prisão. Além disso, os dois crimes não seriam cumulativos.
Deputados dentro do PT comemoram a punição histórica para os
atentados contra a democracia no Brasil e dizem que "seria muito ruim
fazer essa modificação enquanto os julgamentos [da trama golpista] estão em
curso".
Um parlamentar afirma que essa mudança faria com que a pena
de golpe no Brasil pudesse ser menor do que a de roubo de celular, por exemplo
(de 4 a 10 anos).
Em entrevista ao Estúdio I, da GloboNews, Paulinho da Força
disse que "até agora não tem nem rascunho do texto" e disse que
"aqueles que atentaram contra a democracia e o estado democrático de
direito não serão contemplados".
Contudo, ainda segundo o relator, as penas de Jair Bolsonaro
também vão acabar sendo diminuídas com a alteração na lei.
O ex-presidente foi condenado a 27 anos e 3 meses de prisão
por cinco crimes:
>golpe de Estado;
>abolição violenta do estado democrático de direito;
>organização criminosa;
>dano qualificado; e
>deterioração de patrimônio tombado.
Por Elisa Clavery, GloboNews — Brasília
Nenhum comentário