Comissão aprova flexibilização de A Voz do Brasil; entidades criticam. Será o fim?

Pela proposta, as emissoras de rádio
comerciais, comunitárias e legislativas poderão transmitir o programa entre as
19h e as 22h. O horário permanecerá fixo apenas para as emissoras educativas.
O texto original da MP, enviado pelo
Executivo, autorizava a mudança de horário de transmissão da Voz do Brasil
apenas durante a Copa do Mundo. Mas o relatório do senador Ricardo Ferraço
(PMDB-ES), aprovado pelos parlamentares da comissão, modificou a medida e
manteve a flexibilização por tempo indeterminado. Agora, os plenários da Câmara
e do Senado deverão analisar a MP, que tem validade até outubro.
Para Ferraço, a alteração responde
às mudanças que atingiram a sociedade brasileira desde 1935, quando o programa
começou a ser transmitido. “Mudaram-se os hábitos, o Brasil não é mais um país
rural, é um país urbano. E, pela primeira vez, nós tivemos a oportunidade de
experimentar um mecanismo diferente. Durante a Copa do Mundo, o horário foi
flexibilizado, e as pesquisas apontam a aprovação, por parte da população
brasileira, e até mesmo a ampliação da audiência”, disse.
No entanto, a avaliação de Ferraço
não é consensual. Mário Augusto Jakobskind, integrante da Associação Brasileira
de Imprensa (ABI) e do Conselho Curador da Empresa Brasil de Comunicação (EBC),
que opera o programa e produz parte dele, diz que a mudança poderá ser “um erro
crasso dos parlamentares”.
“Flexibilização, na prática,
representa, primeiro, o fim d'A Voz do Brasil a médio e longo prazos, porque
quem é que vai fiscalizar isso? Segundo, esse horário tradicional das 19h às
20h é o horário que milhões de pessoas, pelo Brasil afora, têm informações por
meio d'A Voz do Brasil”, ponderou.
Segundo o Ministério das
Comunicações, havia em 2012, no Brasil, mais de 9,4 mil emissoras de rádio. A dificuldade de fiscalizar todas essas
emissoras também preocupa o Movimento em Defesa da Preservação d'A Voz do
Brasil, que reúne organizações da sociedade civil. O coordenador do movimento,
o jornalista Chico Sant'Anna, disse que programa, considerado o mais antigo do
mundo em operação, é importante para dar transparência pública aos atos dos
Três Poderes e prestar contas à sociedade.
Sant'Anna acredita que a
flexibilização pode prejudicar populações que vivem em cidades distantes dos
grandes centros urbanos. “É um importante elemento de informação para milhões
de brasileiros. Uma pesquisa encomendada pela Secretaria de Comunicação da
Presidência da República identificou que 60% dos moradores da Região Norte e
50% das regiões Nordeste e Centro-Oeste ouvem diariamente A Voz do Brasil e têm
o programa como a única ou quase única informação do que acontece no Brasil”.
A Associação Brasileira de Emissoras
de Rádio e Televisão (Abert), entidade que lançou, neste ano, uma campanha pela
flexibilização do noticiário, argumenta que a mudança não diminuirá o acesso da
população brasileira à informação. De acordo com o presidente da associação,
Daniel Slaviero, durante a Copa do Mundo, apenas 31% das emissoras optaram por
mudar o horário do programa e, segundo ele, teve melhores índices de audiência.
“Os resultados foram muitos claros. Aumentou a audiência porque aumentou a exposição
do programa. O ouvinte que não ouvia às 19h, pode escutar às 20h e as 21h”,
argumentou.
Uma pesquisa encomendada ao
Datafolha pela associação, em fevereiro, aponta que 22% dos 2.091 entrevistados
apontaram que passariam a ouvir mais A Voz do Brasil caso o horário fosse
alterado. A estimativa da Abert é que a audiência do programa aumente até 13
pontos percentuais com a flexibilização. “Estamos convictos de que o texto
aprovado na comissão mista fortalece esse programa centenário, porque aumenta a
exposição”, avaliou Slaviero.
Já as entidades da sociedade civil
apontam que é esse aumento de audiência o que está na mira dos empresários.
“Isso tem simplesmente o objetivo de faturar mais”, diz Sant'Anna, para quem o
programa é um “patrimônio cultural brasileiro”. Ele explica que os
congestionamentos nas grandes cidades criaram um público-alvo em potencial para
as emissoras, justamente no horário de transmissão do programa. “Elas querem
ganhar um maior faturamento porque sabem que o motorista está preso no
trânsito, vai ficar uma ou duas horas, e aí querem veicular mais anúncio
naquele horário”, explicou.
A obrigatoriedade de transmissão do
programa está na lei de 1962 que
institui o Código Brasileiro de Telecomunicações. Esta não é a primeira
tentativa de mudar o horário de transmissão.
Desde 2006, tramita no Congresso projeto de lei com a mesma finalidade.
O texto foi aprovado pela Câmara e já foi apreciado por comissões do Senado,
onde aguarda votação em plenário. Uma ação que questionava a constitucionalidade
da formação de cadeia nacional para a veiculação do programa já chegou ao
Supremo Tribunal Federal (STF), mas o pedido foi negado pelo Supremo, que
entendeu que o Código Brasileiro de Telecomunicações seguiu a Constituição
Federal.
De acordo com a decisão da comissão,
as emissoras de radiodifusão sonora que optarem pela mudança de horário d'A Voz
do Brasil serão obrigadas a veicular, diariamente, às 19h, exceto aos sábados,
domingos e feriados, inserção informativa sobre as retransmissões do programa.
Agência Brasil
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