Temer pediu pessoalmente doação no Palácio do Jaburu, diz delator.
As delações da Operação
Lava Jato, que apura irregularidades na Petrobras, já tinham atingido em cheio
o grupo político do Partido dos Trabalhadores (PT), e que ainda podem atingir
mais nas próximas revelações, voltam-se agora para o núcleo do PMDB e políticos
do PSDB.
No acordo de delação
premiada, o ex-diretor de Relações Institucionais da Odebrechet, Cláudio Melo
Filho, disse que o propósito da empresa era manter uma relação frequente de
concessões financeiras e pedidos de apoio com políticos, em típica situação de
privatização indevida de agentes políticos em favor de interesses empresariais
nem sempre republicanos.
Os pagamentos a políticos
eram indicados por ele e aprovados por Marcelo Odebrecht, pelos presidentes da
empresa ou pelos diretores dos negócios, e os pagamentos eram realizados pela
área de operações estruturadas da Odebrechet.
A chamada "área de
operações estruturadas", depois de uma devassa, neste ano, em uma das
fases da Operação Lava Jato, a Polícia Federal descobriu ser um departamento de
propina.
No acordo de delação
premiada, Cláudio Melo Filho dedica um capítulo ao relacionamento que tinha com
o presidente Michel Temer. O nome do presidente é citado 43 vezes no seu
depoimento.
O ex-diretor afirma que
Michel Temer atuava de forma muito mais indireta, não sendo seu papel, em
regra, pedir contribuições financeiras para o partido, embora isso tenha
ocorrido "de maneira relevante" no ano de 2014.
Mas segundo Cláudio Melo
Filho, ao menos uma vez Michel Temer pediu doações pessoalmente. Foi durante um
jantar no Palácio do Jaburu, residência oficial do vice-presidente da
República, que ocorreu possivelmente no dia 28 de maio de 2014.
Além dele, estavam no
jantar Marcelo Odebrecht, o então vice-presidente Michel Temer e Eliseu
Padilha, atual ministro da Casa Civil, na época deputado federal. Cláudio conta
que uma das provas do encontro é uma chamada telefônica para o celular de
Padilha às 8h16 daquela noite.
O delator relata:
"Chegamos no Jaburu e fomos recebidos por Eliseu Padilha. Como Michel
Temer ainda não tinha chegado, ficamos conversando amenidades em uma sala à
direita de quem entra na residência pela entrada principal. Acredito que essa
sala é uma biblioteca. Após a chegada de Michel Temer, sentamos na varanda em
cadeiras de couro preto, com estrutura de alumínio".
E continua relatando:
"No jantar, acredito que, considerando a importância do PMDB e a condição
de possuir o vice-presidente da República como presidente do referido partido
político, Marcelo Odebrecht definiu que seria feito pagamento no valor de R$ 10
milhões. Claramente, o local escolhido para a reunião foi uma opção simbólica
voltada a dar mais peso ao pedido de repasse financeiro que foi feito naquela
ocasião. Inclusive, houve troca de emails nos quais Marcelo se referiu à ajuda
definida no jantar, fazendo referência a Temer como 'MT".
O delator entregou aos
procuradores cópias de emails em que Marcelo Odebrecht trata dos pagamentos a
"MT", Michel Temer. Em uma das mensagens, Marcelo falou sobre a
doação que faria dos R$ 10 milhões acertada no jantar.
"Depois de muito
choro, não tive como não ajudar na seguinte linha, de ter algum conforto ainda
que 'moral". No fim da mensagem, Marcelo Odebrecht pede para avisar
"MT", Michel Temer, que esta seria a única conta a pagar do time
dele.
O ex-diretor disse que, do
total de R$ 10 milhões prometido por Marcelo Odebrecht em atendimento ao pedido
de Michel Temer, Eliseu Padilha ficou responsável por receber e alocar R$ 4
milhões.
"Compreendi que os
outros R$ 6 milhões, por decisão de Marcelo Odebrecht, seriam alocados para
Paulo Skaff, na época candidato ao governo de São Paulo pelo PMDB", disse.
Ainda segundo Cláudio, um
dos endereços para a entrega dos R$ 4 milhões destinados a Padilha foi o
escritório de advocacia do senhor José Yunes, hoje assessor especial da
Presidência da República, o que deixa a entender que o repasse foi em dinheiro
vivo.
O delator conta ainda que
também levou a Temer recado de Marcelo Odebrecht sobre pergunta de Graça
Foster, então presidente da Petrobras. Ele disse que esteve com Michel Temer,
também, para transmitir a ele um recado a pedido de Marcelo Odebrecht. O recado
era relatar a pergunta que Graça Foster fez a Marcelo Odebrecht sobre a
existência de pagamentos da empresa a nomes do PMDB durante a campanha
eleitoral de 2010.
Para fazer chegar a Michel
Temer seus pleitos, Cláudio se valia de Eliseu Padilha ou de Moreira Franco,
atual secretário no Planalto, que o representavam. Essa era uma via de mão
dupla, pois, segundo Cláudio, Temer também utilizada seus prepostos para
atingir interesses pessoais, como no caso dos pagamentos operacionalizados via
Eliseu Padilha.
Cláudio deu um exemplo de
contrapartida. Segundo ele, Michel Temer, em uma oportunidade, esteve
disponível para ouvir tema de interesse da Odebrecht. Este foi o caso de uma
viagem institucional que seria realizada por Michel Temer a Portugal, país em
que a Odebrecht tem atuação.
Ele disse que entregou a
nota a Michel Temer sobre a atuação da companhia em Portugal. "Esse
exemplo deixa claro a espécie de contrapartida institucional esperada entre o
público e o privado", afirmou ele.
O depoimento de Cláudio
Melo Filho é um acordo de delação premiada. Agora, ele vai detalhar o que
contou, nos próximos dias. Os depoimentos, dos 77 executivos que assinaram o
acordo de delação, serão tomados pela Procuradoria Geral da República.
Depois, os 77 acordos de
delação terão de ser homologados pelo ministro Teori Zavascki, relator da Lava
Jato no Supremo Tribunal Federal (STF). Nessa etapa, o ministro analisa apenas
os aspectos formais da delação, como, por exemplo, se foi feita
espontaneamente. Isso deve ocorrer a partir de fevereiro ou março do ano que
vem.
Após a homologação, vem a
fase de investigações e busca de provas do que foi relatado, para que o
Ministério Público avalie se oferecerá denúncia contra os citados. Portanto, as
consequências penais e criminais ainda vão demorar um pouco para fazer efeito,
mas o efeito político é imediato porque envolve, segundo cálculos, quase 200
nomes de autoridades.
Resposta
dos implicados
Em nota divulgada pelo
Palácio do Planalto, o presidente Michel Temer disse que repudia com veemência
o que chamou de "falsas acusações" de Cláudio Melo Filho. Segundo
Temer, as doações feitas pela construtora Odebrecht ao PMDB foram todas por
transferência bancária e declaradas ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE). A
nota diz ainda que não houve caixa dois nem entrega em dinheiro a pedido do
presidente.
O ministro da Casa Civil,
Eliseu Padilha, disse que a acusação é mentirosa, que não foi candidato em 2014
e que nunca tratou de arrecadação para deputados ou quem quer que seja.
O presidente da Fiesp,
Paulo SKaff, disse que nunca pediu nem autorizou ninguém a pedir qualquer
contribuição que não fosse dentro da legislação. E afirmou que todas as suas
prestações de contas foram aprovadas pela Justiça Eleitoral.
O assessor especial da
Presidência da República, José Yunes, negou ter recebido qualquer quantia da
Odebrecht na campanha de 2014. Disse também que não conhece nem nunca recebeu
Cláudio Melo Filho em seu escritório em São Paulo.
G1
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