CNMP abre representação disciplinar sobre suposta troca de mensagens.
A Corregedoria do Conselho
Nacional do Ministério Público (CNMP), órgão responsável pela fiscalização
disciplinar dos membros do MP, decidiu abrir uma representação disciplinar para
apurar uma troca de mensagens atribuídas a procuradores da força-tarefa da Lava
Jato e ao ex-juiz federal e atual ministro Sergio Moro.
“A ampla repercussão
nacional demanda atuação da Corregedoria Nacional. A imagem social do
Ministério Público deve ser resguardada e a sociedade deve ter a plena
convicção de que os membros do Ministério Público se pautam pela plena
legalidade, mantendo a imparcialidade e relações impessoais com os demais
Poderes constituídos”, escreveu o corregedor Orlando Rochadel Moreira na
decisão.
Ele acrescentou que “sem
adiantar qualquer juízo de valor assevera eventual desvio na conduta de membros
do Ministério Público Federal [MPF], o que, em tese, pode caracterizar falta
funcional”.
O corregedor ordenou que o
coordenador da força-tarefa da Lava Jato, o procurador Deltan Dallagnol, seja
notificado para apresentar a versão dos procuradores sobre os fatos.
O CNPM se refere às notícias
que o site The Intercept Brasil publicou ontem (9), com trechos de conversas
entre juízes e procuradores da República que, na avaliação da equipe de
reportagem do site, revelam uma “colaboração proibida” entre Moro e os
integrantes da força-tarefa Lava Jato. Em um texto que acompanha as três
reportagens já publicadas, o Intercept sustenta que o teor das conversas
fornecidas por uma fonte que pediu sigilo indica “comportamentos antiéticos e
transgressões que o Brasil e o mundo têm o direito de conhecer”.
Em seu Twitter, o procurador
Deltan Dallagnol sugeriu ser natural que membros do MPF, a quem cabe denunciar,
comuniquem-se com o juiz da causa, a quem cabe julgar a denúncia. “A atuação
sórdida daqueles que vierem a se aproveitar da ação do hacker para deturpar
fatos, apresentar fatos retirados de contexto e falsificar integral ou
parcialmente informações atende interesses inconfessáveis de criminosos
atingidos pela Lava Jato”, escreveu.
Repercussão
A Associação dos Juízes
Federais do Brasil (Ajufe) defendeu o esclarecimento do vazamento e do conteúdo
das mensagens que o ex-juiz federal, Sergio Moro, e membros da força-tarefa da
Lava Jato teriam trocado enquanto Moro era o responsável por julgar os processos
da operação em Curitiba.
“As informações divulgadas
pelo site precisam ser esclarecidas com maior profundidade, razão pela qual a
Ajufe aguarda serenamente que o conteúdo do que foi noticiado e os vazamentos
que lhe deram origem sejam devida e rigorosamente apurados”, pontuou a entidade
que representa os magistrados federais, em nota divulgada na tarde de hoje
(10).
Após participar de reunião
hoje em Manaus, o ministro Sergio Moro afirmou a jornalistas que as mensagens
que vieram a público não revelam nada demais. Na avaliação do ministro, grave é
o fato de celulares de procuradores da República e de ao menos um juiz federal
terem sido grampeados.
“E eu nem posso dizer que
são autênticas porque são coisas que aconteceram, se é que aconteceram, há
anos. Eu não tenho mais estas mensagens, pois não as guardo. Não tenho
registros disso”, disse Moro, reforçando não haver, nas mensagens, nenhuma
indicação de ele ter orientado o trabalho acusatório dos procuradores. “Juízes
conversam com procuradores, com advogados, com policiais...Isto é algo normal”,
comentou Moro.
Em uma das mensagens
atribuídas pelo site a Moro, o ministro pergunta ao procurador Deltan
Dallagnol, coordenador da Lava Jato em Curitiba, se o grupo deveria responder
às acusações que o PT estava fazendo à Lava Jato. “O que acha dessas notas
malucas do diretório nacional do PT? Deveríamos rebater oficialmente? Ou pela
Ajufe?", pergunta o ex-titular da 13ª Vara da Justiça Federal de Curitiba.
Para a associação, a menção
à entidade exige que sua atuação institucional seja explicada à opinião
pública. “A Ajufe atua constantemente na defesa de juízes federais responsáveis
por julgamentos importantes em todo o Brasil, incluindo o então juiz federal
responsável pela Operação Lava Jato”, destaca a associação, acrescentando que,
desde 2016, já divulgou 47 notas públicas em defesa de magistrados. “Das quais
apenas oito tratam da Operação Lava Jato ou do atual ministro da Justiça,
Sergio Moro.”
Afirmando confiar na
“honestidade, lisura, seriedade, capacidade técnica e no comprometimento dos
magistrados federais com a Justiça e com a aplicação correta da lei”, a
associação garante que continuará a se manifestar todas as vezes que
prerrogativas da magistratura, como a independência funcional e a liberdade de
decidir segundo a avaliação dos fatos e a interpretação das provas produzidas
no processo estiverem em risco ou sofrendo ataques infundados ou criminosos.
Manifestando “perplexidade e
preocupação” tanto pelo fato de autoridades públicas “supostamente terem sido
“hackeadas”, quanto pelo conteúdo das conversas atribuídas a procuradores da
República e um ex-magistrado, o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do
Brasil (OAB) e o Colégio de Presidentes de Seccionais da entidade recomendaram
que Moro e o procurador Deltan Dallagnol se afastem dos cargos que ocupam até o
esclarecimento dos fatos.
Para os membros do Conselho
Federal da OAB e do Colégio de Presidentes de Seccionais, a interceptação de
mensagens de autoridades públicas representa um grave risco à segurança
institucional, enquanto o teor das conversas atribuídas a Moro e aos
procuradores pode indicar uma ameaça aos alicerces do Estado Democrático de
Direito.
A Associação Juízes para a
Democracia (AJD) e a Associação Latino-Americana de Juízes do Trabalho (ALJT)
também se pronunciaram sobre as notícias divulgadas pelo The Intercept. Em nota
conjunta, as entidades afirmam que as informações revelam que, quando juiz da
Lava Jato em Curitiba, o atual ministro Sergio Moro “aconselhou, ordenou,
sugeriu e, em determinados momentos, agiu como órgão acusador e investigador”.
Por Alex Rodrigues e Felipe
Pontes - Repórteres da Agência Brasil
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