Liberar venda de cigarro eletrônico será retrocesso, diz especialista. Jaqueline Scholz defende a proibição da comercialização do produto.
Cigarro eletrônico, Saúde -
Divulgação Ministério da Saúde
Os efeitos positivos no
Brasil do combate ao tabagismo podem se perder, em parte, caso os cigarros
eletrônicos tenham a venda liberada no país. A coordenadora do Comitê de
Controle do Tabagismo da Sociedade Brasileira de Cardiologia, Jaqueline Scholz,
disse que é preciso manter a proibição, porque os impactos desse produto são
maiores do que os dos cigarros convencionais. Para a médica, seria um grande
retrocesso a abertura do mercado a esses produtos.
“Toda essa política
antitabaco, de prevenção e de cessação poderia ser perdida, na medida em que
você vem com outros produtos que ainda não estão queimados porque não existe
trabalho do ponto de vista de saúde pública mostrando o impacto do real dano
que isso vai provocar”, disse em entrevista à Agência Brasil.
De acordo com a médica, o
Juul, que é tipo de cigarro aquecido no formato de um pen drive, vendido nos
Estados Unidos, além de causar mais dependência, libera uma quantidade maior de
nicotina. Segundo a coordenadora, lá, a FDA [Food and Drug Administration],
agência federal do Departamento de Saúde e Serviços Humanos está preocupada com
os jovens que são a maioria dos consumidores desse produto.
“Para nós é de assustar ver
no mundo, por exemplo, o juul, o cigarro aquecido, que desde 2015 quando foi
lançado é líder de mercado. O FDA está desesperado com o número de usuários com
dificuldade de cessação, porque o produto libera mais nicotina. Um pen drive
pequeno libera mais nicotina do que quase dois maços de cigarro convencional, e
os adolescentes são aprisionados na dependência à nicotina”, disse. Segundo
ela, na Universidade na qual esteve na semana passada para a formatura do seu
filho, um colega dele foi expulso após ser flagrado três vezes com um juul.
De acordo com Jaqueline
Scholz, essa expulsão é apenas um dos casos que têm preocupado diretores de
escolas americanas por causa do uso de cigarros eletrônicos entre os alunos.
“Há relatos de diretores de escola solicitando auxílio porque os adolescentes
não conseguem se privar. Eles têm abstinência rápida. É uma forma de nicotina
diferente dos outros cigarros ou mesmo dos outros cigarros eletrônicos. Isso
faz com que a absorção seja maior e a concentração do produto também é maior,
então, o impacto cerebral é muito grande. É impressionante. A gente não quer
isso aqui”.
A médica fez questão de
acentuar os efeitos nocivos sobre a saúde de quem faz uso do juul, que atinge
também o lado emocional da pessoa. “O custo psicoemocional é muito grande. A
pessoa precisa ser medicada em uma crise de abstinência, porque se privou do produto,
não consegue ter controle emocional e tem sintomas como irritabilidade, falta
de concentração, angústia por não ter o produto. Isso destrói o cérebro”,
disse. “Essa para mim é a grande questão. A questão da dependência e de como o
indivíduo depende da droga a cada momento para poder pensar, raciocinar e
viver”, completou.
Tânia Cavalcante,
secretária-executiva da Comissão Nacional para a implementação da Convenção
Quadro para controle do Tabaco, da Organização Mundial da Saúde (OMS), da qual
o Brasil é signatário, também alerta para os efeitos nocivos do cigarro
eletrônico. Para a médica do Instituto Nacional do Câncer (Inca), a falta de um
relatório de segurança de uso e de eficácia, porque o produto é apresentado
também como uma alternativa de uso do cigarro convencional, exigido na
regulamentação da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), acaba
provocando a proibição de venda no Brasil.
“Ninguém nunca apresentou
esse relatório e, por enquanto, a Anvisa não liberou, mas existe uma pressão
muito grande, agora que as grandes empresas de cigarros convencionais aderiram
aos cigarros eletrônicos, já que teve um crescimento desse produto no mercado
mundial”, disse à Agência Brasil, acrescentando que nem os eletrônicos, nem os
convencionais são inócuos.
“Alguns dos cigarros
eletrônicos líquidos pesquisados, mostraram que têm menos substâncias tóxicas
que nos convencionais. Não tem alcatrão e não tem monóxido de carbono, mas não
é um produto inócuo. Tem substâncias cancerígenas, tem partículas que causam
danos no pulmão interfere no sistema cardiovascular, então, não é um produto
para criança e adolescente usar”, afirmou.
A médica do Inca chamou
atenção que independentemente da regulamentação da Anvisa, sites brasileiros
oferecem a venda cigarros eletrônicos. “É uma violação da legislação no Brasil.
Anvisa está tentando. Ela fecha um site, outro abre. É uma coisa muito difícil.
É uma briga muito inglória. A internet é um território de ninguém. No Brasil,
não teve a epidemia como nos Estados Unidos porque a Anvisa embarreirou”,
disse.
Fumante passivo
Outra questão que preocupa
os especialistas da área, são os fumantes passivos. Aqueles que não fazem uso
de cigarro, mas acabam sofrendo os efeitos do produto por estarem em ambiente
com a presença da fumaça provocada causada por quem fuma. O presidente da
Sociedade Brasileira de Angiologia e de Cirurgia Vascular, Roberto Sacilotto,
disse que essas pessoas correm o risco de adquirirem doenças pulmonares
crônicas, asma, bronquite. “Se o fumante tem hábito de fumar em ambiente
fechado, em casa, nos quartos pode levar ao tabagismo passivo”, disse.
O médico destacou que a
Sociedade Brasileira de Angiologia e de Cirurgia Vascular alerta ainda para
outros impactos que os fumantes podem sofrer além das doenças cardíacas e
pulmonares. “Se ele continua a fumar durante muito tempo tem uma chance de mais
de 11% de evoluir para uma amputação de um membro inferior. É um dos fatores
importantes. Não é o único. O tabagismo entra junto com aumento de colesterol,
aumento de pressão, diabetes. O tabagismo pode modificar a evolução de uma
doença, como a aterosclerótica, uma doença de membros inferiores”, alertou.
Por Cristina Índio do Brasil
- Repórter da Agência Brasil
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