MPF ajuíza ação contra Município de Lucena (PB) e agentes públicos por dano moral coletivo.
Foto: Ascom/MPF |
Prefeitura iniciou imunização
de crianças de forma antecipada, com doses destinadas a adultos. Trinta e seis
receberam vacinas com o prazo de validade vencido.
O Ministério Público Federal
(MPF) ajuizou ação civil pública, com pedido de liminar, em face do Município
de Lucena (PB), do prefeito, além de técnica de enfermagem que aplicou vacinas
contra covid-19 em crianças, por dano moral coletivo relativo à inobservância
de protocolos de operacionalização da imunização. O MPF requer R$ 1 milhão, a
ser pago pelos três demandados.
Na ação, o MPF pleiteia à
Justiça, também, que a prefeitura, no prazo máximo de cinco dias, apresente
plano de nova vacinação das pessoas que foram imunizadas com doses fora da
validade, indicando datas previstas de início e término, bem como planejamento
de busca ativa, dando-lhe imediato cumprimento e comprovando a sua
implementação. Requer, ainda, que, caso a Prefeitura de Lucena não apresente o
plano de revacinação, que a União, em cinco dias, assuma as ações relacionadas
com a execução do programa de imunização no município, tendo em vista se tratar
de uma situação de urgência, conforme autoriza o § 1º do artigo 3º da Lei
6.259/75.
De acordo com as investigações,
há um dano estimado aos cofres públicos de R$ 150 mil, considerando o valor das
vacinas “perdidas”, que gira em torno dos 12 dólares (a unidade de imunizante),
conforme levantamento do Tribunal de Contas da União (TCU).
Suspensão de exercício
profissional – O Ministério Público Federal quer, também, que o Conselho
Regional de Enfermagem da Paraíba (Coren-PB) suspenda, temporariamente, o
exercício profissional da técnica de enfermagem enquanto são finalizadas
apurações de denúncia em tramitação no Departamento de Processo Ético do
conselho. Para o MPF, esta é “uma medida necessária para a prevenção de
situações semelhantes como as ocorridas no município de Lucena, especialmente
levando-se em conta o risco de reiteração da prática; a gravidade da infração
ética, em especial para a população de alto risco neste momento da pandemia; a
repercussão social do fato; e o elevado clamor social, público e popular”.
Inadequação vacinal – As
investigações que resultaram a propositura da ação iniciaram a partir de
inadequação vacinal constatada em 49 crianças (sendo 36 com prazo de validade
vencido) de dois assentamentos do Instituto Nacional de Colonização e Reforma
Agrária (Incra) localizados em Lucena. A despeito de os imunizantes infantis terem
sido disponibilizados apenas a partir do dia 14/01/2022, o município decidiu
iniciar a imunização do público infantil nos dias 21/12/2021 e 07/01/2022, com
as doses da vacina destinadas ao público adulto, tendo parcela desse público
infantojuvenil recebido doses com a validade expirada em função da temperatura.
Ademais, de acordo com relatório
da Secretaria de Estado da Saúde (SES-PB), foi constatado que ao menos 880
adolescentes e adultos em Lucena foram imunizados de forma inadequada com doses
de Pfizer vencidas.
Ainda segundo o Ministério
Público na ação, tem-se um contingente relevante de pessoas que, a despeito de
terem sido vacinadas, podem não ter a proteção necessária, haja vista que todas
as vacinas dos lotes identificados pela SES, aplicadas fora do prazo limite de
validade por temperatura, são consideradas inválidas, conforme indicado pela
Secretaria de Estado da Saúde.
“Com isso, é necessário que a
gestão municipal avalie cada situação, convocando a população para
esclarecimentos, orientações e fortalecimento da vacinação para efetivação do
processo de imunização. Todavia, até o momento, o município não apresentou
nenhum planejamento nesse sentido. A bem da verdade, quase que a totalidade dos
esforços na busca de esclarecimentos dos fatos foram efetuados pela Secretaria
de Saúde do Estado, não tendo o município demonstrado o interesse necessário a
solucionar as problemáticas, não à toa incorreu em todas as irregularidades
descritas, as quais implicaram em gravames a um número considerável de
pessoas”, acrescentam os procuradores que assinam a ação – Janaina Andrade e
Guilherme Ferraz.
Os membros do MP reforçam que
irregularidades na campanha de vacinação em Lucena não se limitaram ao período
de dezembro de 2021 a janeiro de 2022. Complementam informando que “desde
meados do segundo semestre de 2021, tem sido observadas falhas na execução da
política pública em comento na localidade, bastando, para tanto, analisar o
relatório de fiscalização elaborado pela Procuradoria da República na Paraíba,
em setembro do ano passado, no qual já se apontavam falhas nesse processo, a
exemplo do acondicionamento inadequado dos imunizantes”.
TACs – Antes de ajuizar ação
contra o prefeito e a profissional de saúde, o MPF tentou firmar termo de
ajustamento de conduta (TAC) com os demandados, que não aceitaram proposta de
acordo do Ministério Público. A legislação e o Conselho Nacional do Ministério
Público (CNMP) permitem e estimulam que haja TACs entre o Ministério Público e
as partes. Tais acordos não implicam reconhecimento de culpa ou de
responsabilidade pelo compromissário, significando, por outro lado, um
comprometimento com a responsabilidade social em contribuir para ações
assistenciais e de saúde durante o atual momento de crise sanitária,
prestando-se, assim, homenagem à Justiça Consensual em favor de soluções mais
ágeis e úteis ao interesse público.
Pedido de desculpas – Por fim, o
MPF solicita na ação ajuizada pedido formal de desculpas pelo Município de
Lucena, tendo por base o artigo 1o, caput, e incisos I e III da Resolução no
225/2016: “no próprio conceito normativo de Justiça Restaurativa, a ideia de
que a Justiça Restaurativa envolve a corresponsabilidade individual e coletiva,
para fins de se entender as causas estruturais do conflito e as necessidades
daí advindas, possibilitar a reparação dos danos – a partir da
responsabilização ativa dos responsáveis e corresponsáveis – e, ainda, recompor
as relações interpessoais e sociais esgarçadas”.
Fiscalização – Nesta quarta-feira
(23), uma equipe do Ministério Público Federal se fez presente, mais uma vez,
em Lucena, para acompanhar a vacinação de crianças de 5 a 11 anos que foram
imunizadas de forma inadequada. Segundo a procuradora regional dos Direitos do
Cidadão, Janaina Andrade, houve baixa adesão, em razão do medo que acomete as
mães. “Embora tenha havido reuniões do MPF e a gerente- executiva de Vigilância
Epidemiológica da Paraíba, Talita Tavares, com as mães dos assentamentos,
colocando a importância da vacinação, houve resistência por parte de algumas”,
disse Janaina. A ação desta quarta teve por objetivo principal complementar o
ciclo vacinal das 14 crianças do Assentamento Estiva do Geraldo, que receberam
doses de adulto no dia 21 de dezembro passado. No entanto, apenas seis
aceitaram tomar a vacina.
Também foram disponibilizadas no
Assentamento Outeiro de Miranda doses para o início do ciclo vacinal do
restante das crianças que não tomaram vacina no último dia 9 – aquelas que
foram imunizadas indevidamente com doses de adultos e vencidas, no dia 7 de
janeiro. Há previsão que, neste assentamento, no próximo dia 9 de março, a SES,
a pedido do MPF, acompanhe novamente a vacinação de crianças para o fechamento
do ciclo vacinal.
Eficácia das vacinas – Janaina
Andrade reforça que as crianças vacinadas indevidamente, com doses para
adultos, não tiveram reações graves, de acordo com avaliação das equipes
técnicas da Secretaria de Estado da Saúde (SES) e Ministério da Saúde. Ela
ressalta que as vacinas têm eficácia contra as formas graves da covid-19 e
conclama os pais de todo o estado a levarem seus filhos aos postos de
vacinação. “O fato ocorrido em Lucena foi um erro de vacinação isolado e não
representa falta de segurança dos imunizantes”, lembra a procuradora do
Ministério Público Federal, enfatizando que “além da segurança e eficácia da
vacina já comprovadas por órgãos sanitários, os dados indicam que grande parte
das pessoas que estão internadas com quadros graves é porque não estão
vacinadas ou estão com o ciclo de imunização incompleto”.
Ação nº 0801497-09.2022.4.05.8200
Assessoria de Comunicação | Ministério
Público Federal na Paraíba
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