CGU recomendou suspensão de descontos em folha de aposentados. Pedido já tinha sido feito após auditoria entre abril e julho de 2024.
Após auditoria realizada entre abril e julho de 2024, a
Controladoria-Geral da União (CGU) recomendou que o Instituto Nacional do
Seguro Social (INSS) deixasse de intermediar a cobrança de mensalidades
associativas em favor de entidades civis. O relatório da auditoria, concluído
em dezembro de 2024, foi tornado público nesta terça-feira (6). No final de
abril, a Polícia Federal e a CGU deflagraram uma operação para desvendar um
esquema de desvios ilegais de benefícios previdenciários pagos a milhões de aposentados
e pensionistas do país.
No documento, a CGU aponta a fragilidade dos mecanismos de
controle adotados pelo instituto "no âmbito do processamento dos descontos
associativos” e faz 12 recomendações ao INSS.
Entre a sugestões estava a elaboração de uma proposta de
descontinuação de descontos de mensalidades associativas a ser submetida ao
Ministério da Previdência Social. O objetivo era avaliar a legalidade dos
descontos e do repasse a associações, sindicatos e entidades.
Além da suspensão dos acordos de cooperação técnica (ACTs) do
INSS com 29 entidades - de opção de débito automático a seus filiados e
cancelamento dos descontos em folha -, a CGU recomendou a formulação de medidas
para casos de cobranças ilegais.
No último dia 23 de abril, quando a PF e a CGU deflagraram a
Operação Sem Desconto, os convênios foram suspensos.
Inspeções
Durante a auditoria, servidores regionais da CGU
inspecionaram 29 entidades que, juntas, reuniam quase 5,98 milhões de
aposentados e pensionistas com mensalidades descontadas em seus contracheques.
As entidades faturavam o equivalente a R$ 229,46 milhões mensais.
“Em setembro de 2024, existiam 37 entidades com descontos de
mensalidades associativas, que recebiam R$ 255,2 milhões/mês. Em janeiro de
2025, já eram 49 entidades que recebiam as mensalidades, chegando a um montante
de R$ 257,1 milhões em descontos”, diz o relatório.
No documento, a controladoria indicou a necessidade de o INSS
aprimorar os procedimentos de formalização, acompanhamento, suspensão e
cancelamento dos ACTs, assegurando que as 29 entidades sociais visitadas não
tinham apresentado “evidências que atestassem a capacidade operacional de
atender ao elevado crescimento do número de beneficiários [filiados] com
descontos associativos”.
Durante a auditoria, servidores regionais da CGU
entrevistaram dirigentes das entidades e coletaram informações sobre a
estrutura das entidades e os serviços oferecidos. Também solicitaram
apresentação de documentos para demonstrar capacidade de oferecer serviços e
benefícios prometidos e comprovassem a legitimidade das autorizações de
descontos.
De uma pequena amostra de 952 pessoas, as entidades só
apresentaram a documentação completa de 275 (28,9%). A documentação de 304
beneficiários (31,9%) apresentavam algum tipo de inconformidade – incluindo 167
casos de falta de identificação do beneficiário e 74 que não tinham o termo de
filiação. No caso de 373 pessoas (39,2%), as organizações não apresentaram
documento que demonstrasse autorização de descontos.
“Quatro entidades se negaram a disponibilizar documentos à
CGU sob alegação de que o ACT pactuado estabelece que a relação objeto dos
acordos se dá apenas entre a entidade e o INSS, e que não caberia à CGU
requisitar documentos ou dados a entidade privada e/ou fiscalizar relações
privadas e aplicação de recursos oriundos das contribuições associativas.”
Consultados, o INSS e o Ministério da Previdência Social não
se manifestaram sobre o relatório da CGU até a publicação desta reportagem.
Entenda o caso
A mensalidade associativa é uma contribuição que aposentados
e pensionistas pagam para fazer parte de uma associação, sindicato ou entidade
de classe que represente os interesses de seus associados.
A cobrança em folha é permitida desde 1991, quando entrou em
vigor a Lei dos Benefícios da Previdência Social. É feita com base nos acordos
de cooperação técnica (ACTs) que o INSS assina com as entidades para as quais,
posteriormente, repassa o valor deduzido das aposentadorias e pensões.
Indícios de ilegalidades levaram a PF e a CGU a deflagrar, no
último dia 23, uma megaoperação para aprofundar as investigações sobre um
esquema nacional de descontos em folha não autorizados – que conforme
demonstram os dois relatórios que a CGU divulgou nos últimos, já vinham sendo
apurados no âmbito administrativo.
A chamada Operação Sem Desconto resultou na exoneração do
então presidente do INSS Alessandro Stefanutto e no afastamento de outros
quatro dirigentes da autarquia e de um policial federal lotado em São Paulo.
Para o lugar de Stefanutto, o governo federal escolheu o procurador federal
Gilberto Waller Júnior
Na sequência, o INSS suspendeu os acordos de cooperação
técnica com todas as associações, sindicatos e entidades e, consequentemente,
os descontos automáticos de milhões de beneficiários. Poucos dias após a
demissão de Stefanutto, Carlos Lupi deixou o comando do Ministério da
Previdência Social, ao qual o INSS está subordinado.
No rastro da operação, a Advocacia-Geral da União (AGU) criou
um grupo especial para propor medidas judiciais e administrativas com o
objetivo de recuperar o prejuízo, ressarcir os beneficiários do INSS e propor
novas medidas contra fraudes. Por decisão judicial, mais de R$ 1 bilhão em bens
patrimoniais dos investigados estão bloqueados para, eventualmente, reparar
parte dos danos.
O INSS está elaborando a proposta de um "plano de
ressarcimento excepcional" para aposentados e pensionistas vítimas dos
descontos não autorizados. Membros do governo têm assegurado que todos serão
devidamente ressarcidos se comprovadas as ilegalidades.
Valor das deduções
Dados do INSS e da CGU apontam para o “súbito" aumento
no montante dos descontos de mensalidades associativas na folha de pagamento a
partir de 2016, quando os descontos somaram R$ 413 milhões.
Em 2017, o montante subiu para R$ 460 milhões. Já em 2018,
foram descontados R$ 617 milhões. Em 2019, R$ 604 milhões. Em 2020, em meio à
pandemia de covid-19, o valor caiu para R$ 510 milhões. Em 2021, o total voltou
a subir, atingindo R$ 536 milhões. Em 2022, foram R$ 706 milhões. Em 2023, R$
1,2 bilhão. E, no ano passado, R$ 2,8 bilhões.
As reclamações aumentaram praticamente no mesmo ritmo dos
descontos. Só entre janeiro de 2023 a maio de 2024, o instituto recebeu mais de
1,163 milhão de pedidos de cancelamento de cobranças. A maioria com a
justificativa de que não tinham sido autorizados pelos beneficiários ou seus
representantes legais.
Agência Brasil
Nenhum comentário